1 - Na fixação da matéria de facto provada, o tribunal de 1.ª instância rege-se pelo princípio da livre apreciação da prova, podendo ocorrer alteração da convicção já formada, por parte do Tribunal da Relação, que se deve reger também pelo aludido princípio, nos termos do artigo 662.º do Código de Processo Civil.
2 - A obra incorpórea ou intelectual mostra-se subtraída do âmbito do contrato de empreitada, tal como o mesmo se mostra definido no Código Civil (artº 1207º) no qual se omite, intencionalmente, a referência à prestação de um serviço.
3 - A realização de um trabalho de arquitectura, ou qualquer outra obra de natureza intelectual configura, um contrato de prestação de serviços inominado, na medida em que nele o autor se obrigou a proporcionar à ré o resultado do seu trabalho intelectual, mediante retribuição - art.º 1154.º do Código Civil.
4- Ao contrário do que acontece com o projecto de arquitectura o qual define o aspecto da obra (forma, volumes e dimensões) e que acaba por ser transportada para uma realização corpórea (o edifício) possuindo assim uma maior afinidade com o objecto típico da empreitada, um projecto de especialidades, mais propriamente o projecto de estabilidade, é elaborado com base em cálculos e formulas matemáticas complexas que define os esforços estruturais a considerar que têm de ser tidos em conta, bem como as características da estrutura resistente dos edifícios, com a eleição dos materiais, seu dimensionamento e disposição, por forma a ser assegurada e garantida a sua estabilidade e integridade ao longo do tempo.
5- Embora este projecto seja depois transposto para uma obra corpórea, as suas manifestações radicando em fórmulas, cálculos e modelos matemáticos intrincados e complexos que são incomensuravelmente menos detetáveis e cognoscíveis, não saltam à vista de um cidadão médio, ao contrário da generalidade dos defeitos exibidos pelas coisas corpóreas.
6. Dada a relevância deste projeto para um edifício os coeficientes de segurança dos projetos de estabilidade são dimensionados por excesso, tendo em conta a elevada duração que é suposto conferir a edificações e à exposição e ocorrência de fenómenos que provocam cargas e esforços adicionais.
7. Um projeto de estabilidade é elaborado para ser indefinidamente duradouro. A exigência da sua conformidade com as regras técnicas e as normas legais obedece a razões de segurança de longo termo das edificações, relacionadas com a salvaguarda da integridade física e vida dos utilizadores da obra a que não são estranhas razões de interesse público.
8- No caso de um projeto de estabilidade estaremos perante um contrato de prestação de serviços atípico, que apresenta uma afinidade nula ou escassa com o contrato de empreitada ou mandato.
9-A sua atipicidade determinará, a aplicação das regra contidas nas suas próprias cláusulas e as normas gerais dos contratos, admitindo, ainda, a aplicação das regras do mandato devidamente adaptadas, se disso for caso, e, na medida do possível e sempre que a semelhança das situações o justifique.
Processo n.º 492/10.0TBPTL.G1