O Presidente da República vetou o decreto que altera o Estatuto da Ordem dos Médicos (EOM) e enviou à Assembleia da República da sua justificação ontem, 12 de dezembro.
Já o Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (EOROC) foi promulgado, depois de ouvido o respetivo Bastonário, embora com um aviso ao Parlamento para que pondere a especificidade desta profissão, que ficará submetida a uma dupla supervisão e, portanto, com risco de conflitos de competências neste âmbito.
Foi ainda promulgado ontem o Estatuto da Ordem dos Médicos Veterinários que também é alvo de críticas pelo PR.
VETO AO ESTATUTO DA ORDEM DOS MÉDICOS
O decreto foi devolvido à Assembleia da República sem promulgação. Em causa está a nova formulação do ato médico e a falta de intervenção da Ordem no reconhecimento de idoneidade e capacidade formativa dos serviços, nomeadamente no que respeita aos colégios da especialidade.
Tal como noutros casos de veto, o PR entende que está em causa a segurança dos doentes e a própria organização e estabilidade do Serviço Nacional de Saúde.
Definição de ato médico
Desde logo, o PR entende que a nova formulação do ato médico é pouco adequada. A nova definição teve a oposição da Ordem na medida em parecem existir sobreposições de competências dos vários profissionais de saúde, com inerente risco para a prestação dos cuidados de saúde aos doentes.
Um novo artigo 96.º-A foi introduzido neste Estatuto, com a definição dos atos médicos, segundo o qual são atos próprios dos médicos o exercício em exclusivo da atividade diagnóstica, prognóstica, de vigilância, de investigação, de perícias médico-legais, de codificação clínica, de auditoria clínica, de prescrição e execução de medidas terapêuticas farmacológicas e não farmacológicas, de técnicas médicas, cirúrgicas e de reabilitação, de promoção da saúde e prevenção da doença em todas as suas dimensões, designadamente física, mental e social das pessoas, grupos populacionais ou comunidades, no respeito pelos valores deontológicos e das leges artis da profissão médica.
Constituem ainda atos médicos as atividades técnico-científicas de investigação e formação, de ensino, assessoria, de educação e organização para a promoção da saúde e prevenção da doença, quando praticadas por médicos.
A identificação de uma doença ou do estado de uma doença pelo estudo dos seus sintomas e sinais e análise dos exames efetuados constitui um procedimento base em saúde que deve ser realizado por médico e visa a instituição da melhor terapêutica preventiva, cirúrgica, farmacológica, não farmacológica ou de reabilitação.
Tal como acontece com os advogados, cujo estatuto foi igualmente vetado, também para os médicos se prevê expressamente que, apesar de todas estas regras, não fica prejudicado o exercício dos referidos atos por pessoas não inscritas na Ordem, desde que legalmente autorizadas para o efeito.
Colégios de Especialidades
O PR entende ainda que este EOM não assegura a autonomia da Ordem dos Médicos, designadamente no que respeita à competência dos Colégios de Especialidades.
As novas regras estabelecem uma relação no domínio da hierarquia, o que põe em causa o princípio da autorregulação. O PR acompanha a Ordem dos Médicos considerando que se afasta a Ordem de uma intervenção essencial no que respeita ao reconhecimento de idoneidade e respetiva capacidade formativa dos serviços, e na definição dos conteúdos formativos para cada especialidade.
Ora, para o PR, trata-se de aspetos de natureza puramente técnica, pelo que se compromete a qualidade da formação destes profissionais no futuro e, consequentemente, a qualidade dos cuidados médicos e a segurança dos doentes, bem como a própria organização e estabilidade do SNS.
ESTATUTO DA ORDEM DOS REVISORES OFICIAIS DE CONTAS PROMULGADO
O decreto que aprova as alterações ao EOROC foi alvo de promulgação.
Ainda assim, o PR refere que o Parlamento deve, no âmbito de uma eventual alteração legislativa a este Estatuto, ponderar a especificidade da profissão, que fica agora submetida a uma dupla supervisão:
- do Regime Jurídico da Supervisão de Auditoria, que já existe; e
- do novo órgão de supervisão independente criado dentro desta Ordem, à semelhança do que acontece nos restantes estatutos alterados.
Para o PR, é necessário garantir que não existam conflitos de competências na supervisão das funções de auditoria/revisão legal das contas, nomeadamente em relação a entidades de interesse público.
ESTATUTO DA ORDEM DOS MÉDICOS VETERINÁRIOS PROMULGADO
Também neste caso o PR entende que o Parlamento terá de revisitar o regime dos atos da profissão de médico veterinário, de forma a clarificar que não existam contradições entre os atos não reservados aos Médicos Veterinários e os atos exclusivos da profissão.
Há, portanto, interesse em reapreciar a matéria dos atos próprios da profissão, por forma a garantir o nível da qualidade e segurança dos cuidados nutricionais prestados à população, tendo nomeadamente em conta a importância, em termos de saúde pública, do diagnóstico nutricional de indivíduos e grupos populacionais diferenciados, bem como da respetiva terapêutica nutricional.
Para o PR, tanto a telemedicina (ato não reservado aos Médicos Veterinários) como a assistência clínica a animais (ato próprio da profissão), implicam a necessidade de formação médico-veterinária para efetuar a profilaxia, o diagnóstico e o tratamento. A prescrição (em ambos os casos) está sujeita à lei do medicamento veterinário, por imperativo da legislação europeia.
Devem assim ser alvo de novo trabalho, que o Parlamento já admitiu quando aprovou o texto final que deu origem a este Decreto.
Referências
Carta do Presidente da República, de 12.12.2023
Decreto da Assembleia da República 97/XV, de 13.10.2023, novo artigo 96.º-A
Decreto da Assembleia da República 94/XV, de 13.10.2023
Decreto da Assembleia da República 108/XV