Uma empresa apresentou à Autoridade Tributária e Aduaneira um pedido de informação vinculativa relativamente à emissão de faturas e notas de crédito de cauções de rendas entre sociedades.
Pretende saber se deve ser efetuada retenção, se emitir uma fatura relativa a uma caução de renda a outra sociedade, caução esta que pode ser restituída no final do contrato.
Pretende também saber se, em caso positivo, e se houver lugar à restituição da caução no final do contrato, se é necessário emitir uma Nota de Crédito com a retenção.
A AT, como entende que a caução é um rendimento predial, sendo obtido em território português e o seu devedor um sujeito passivo de IRC, considera que o seu pagamento está sujeito a retenção na fonte à taxa de 25%.
Por outro lado, entende que esta retenção tem um carácter de pagamento por conta e, por isso, será tida em consideração no apuramento do IRC.
Ou seja, alargou o entendimento que tem relativamente ao IRS ao IRC.
Recordamos que o CAAD tem um entendimento diferente relativamente a esta matéria.
Interpretação da AT
No seguimento da sua interpretação já conhecida e constante relativamente ao IRS, a AT considera que a caução é um rendimento.
E invoca uma norma do Código de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) que determina que se consideram «rendimentos e ganhos os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória».
O mesmo Código enumera de forma exemplificativa os rendimentos que concorrem para a formação do lucro tributável, incluindo nestes os rendimentos de imóveis.
Como a norma não concretiza o que se entende por rendimento de imóveis, a AT recorre às regras gerais de interpretação.
O legislador fiscal concretiza no CIRC o que entende por rendimentos prediais para efeitos de IRC, e remete para a qualificação de rendimentos prediais tal como são definidos para efeitos de IRS.
O CIRS determina que se consideram-se rendimentos prediais as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respetivos titulares, quando estes não optarem pela sua tributação no âmbito da categoria B.
Recordamos que quanto à classificação como rendimentos prediais dos montantes pagos a título de caução, no âmbito de um contrato de arrendamento, a AT emitiu em junho do ano passado um Ofício Circulado que determina que com a celebração do contrato de arrendamento, as partes podem estipular o recebimento de valores a título de antecipação de rendas e a título de caução, podendo esta última assegurar o cumprimento das obrigações decorrentes desse contrato, ou seja, quer o pagamento das rendas, quer a reparação de eventuais danos que possam ser causados no imóvel e/ou mobiliário.
Assim, o legislador fiscal procedeu a uma redefinição, para efeitos de IRS, do conceito de renda utilizado no direito civil, dando-lhe uma amplitude maior do que a que resulta desse ramo do Direito.
Desta forma, consideram-se rendimentos prediais as rendas de prédios rústicos, urbanos e mistos colocadas à disposição dos respetivos titulares, quando estes não optarem pela sua tributação no âmbito da categoria B.
As ações incidentes sobre o bem imóvel que dão origem à qualificação do rendimento como renda, nomeadamente, as importâncias relativas à cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência.
Considerando-se que o rendimento disponibilizado a título de caução traduz-se, efetivamente, num acréscimo de valor ao património de quem cede o uso ou o gozo temporário do bem locado, associado e acordado em razão do contrato celebrado e com reflexos na sua capacidade contributiva do ano da disponibilização, e tendo em conta que, nos termos do Código do IRS, os rendimentos prediais (rendas) relevam no momento do seu pagamento ou colocação à disposição dos respetivos titulares, é de considerar a caução como renda para efeitos de IRS, no ano do seu recebimento.
Para efeitos de retenção na fonte, o que releva é o pagamento ou colocação à disposição dos rendimentos e não o princípio da especialização económica dos exercícios.
Assim, configurando a caução um rendimento predial, tal como definido para efeitos de IRS, sendo o mesmo obtido em território português e o seu devedor um sujeito passivo de IRC, fica o respetivo pagamento da caução sujeito a retenção na fonte à taxa de 25%.
Isto porque o CIRC remete para a qualificação de rendimentos prediais constante no CIRS, pelo que, neste âmbito, releva a definição de rendimentos prediais referida supra.
Como o rendimento disponibilizado a título de caução se traduz num acréscimo de valor ao património de quem cede o uso ou o gozo temporário do bem locado integrando o conceito de rendimento predial para efeitos de IRS, também o será para efeitos de IRC.
Configurando a caução um rendimento predial, tal como definido para efeitos de IRS, fica o respetivo pagamento da caução sujeito a retenção na fonte.
A retenção na fonte deve ser efetuada mediante a aplicação de uma taxa de 25%. O momento relevante é o pagamento ou a colocação à disposição de rendimentos, e não o princípio da especialização dos exercícios.
Conclui-se assim que, de acordo com a remissão constante do CIRC para o CIRS, o pagamento de uma caução fica sujeita a retenção na fonte.
Atendendo à natureza da caução, que visou o cumprimento das obrigações do contrato e que poderá ser devolvida no final deste, após o cumprimento das obrigações contratuais, para efeitos contabilísticos, na esfera jurídica da senhoria, constituiu-se uma obrigação, que poderá cumprir a definição de passivo.
Pelo que, caso o montante recebido a título de caução não tenha sido reconhecido, contabilisticamente, em contas de resultados e, por isso, não tenha integrado o resultado líquido do período, a empresa deverá fazer as devidas correções no Quadro 07 da Modelo 22, designadamente, aquando do recebimento da caução, acrescer o montante da mesma no Campo 752 e deduzir esse montante, no Campo 775 do Quadro 07 da Modelo 22, no período em que se concretizar a devolução, incluindo as respetivas notas explicativas no processo de documentação fiscal.
Relativamente à emissão de Nota de Crédito pela restituição da caução com a retenção na fonte, a AT considera que a retenção na fonte efetuada sobre os rendimentos prediais que são pagos ou colocados à disposição, reveste a natureza de pagamento por conta de imposto devido a final.
Assim, esses pagamentos antecipados não têm um carácter definitivo e, aquando da liquidação, no cálculo do imposto devido a final, poderá resultar a existência de um remanescente em dívida ou haver lugar ao reembolso de parte do valor de imposto já pago.
Conclui por isso que a retenção na fonte, efetuada sobre o montante prestado a título de caução, tem um carácter de pagamento por conta e, por isso, será tida em consideração no apuramento do IRC.
A retenção na fonte que incidiu sobre o montante prestado a título de caução não releva para efeitos de emissão da Nota de Crédito respeitante à devolução da caução prestada, porquanto já terá sido considerada a título de "pagamento por conta", no apuramento do imposto a pagar/ receber respeitante ao período em que houve o recebimento da caução.
Referências
Informação Vinculativa, de 04.03.2024
Decisão Arbitral do CAAD, de 30.10.2023
Ofício-circulado n.º 20256/2023, de 07.06.2023