O Supremo Tribunal Administrativo (STA) uniformizou jurisprudência ao decidir que, no quadro de aplicação do Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), a dedução dos benefícios fiscais relacionados com o Sistema de Incentivos Fiscais à I&D Empresarial (SIFIDE) não fica limitada à coleta individual de cada sujeito passivo que integra o grupo.
O caso
Uma sociedade gestora de participações sociais interpôs recurso para uniformização de jurisprudência para o STA de uma decisão arbitral que julgara parcialmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto a parte da liquidação de IRC, por considerar que a referida decisão arbitral colidia com outra já transitada em julgado. Em causa estava a aplicação das limitações previstas para a dedução de prejuízos fiscais à dedução de benefícios fiscais.
Apreciação do Supremo Tribunal Administrativo
O STA tomou conhecimento recurso, concedendo provimento ao mesmo e uniformizou jurisprudência no sentido de que no quadro de aplicação do Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), a dedução dos benefícios fiscais relacionados com o Sistema de Incentivos Fiscais à I&D Empresarial (SIFIDE) não fica limitada à coleta individual de cada sujeito passivo que integra o grupo tendo, em consequência, anulado a decisão arbitral recorrida e a liquidação de IRC relativa ao ano de 2015, na correspondente medida.
A dedução de benefícios fiscais não encontra qualquer previsão limitativa dos termos em que ocorre, nem essa falta de previsão pode ser encontrada na lei ou ser obtida através de uma interpretação analógica.
Não está em causa uma lacuna normativa, mas uma lacuna de regulação por efeito de a norma que regula o procedimento de liquidação de IRC, no que se refere à dedução de benefícios fiscais, não conter uma regra para a situação específica em que as empresas titulares dos benefícios fiscais tenham transitado para um outro grupo de sociedades.
No regime jurídico português, o regime de tributação especial dos grupos de sociedades assenta na possibilidade de determinação de uma base de tributação comum. Trata-se de um modelo que permite a agregação dos resultados individuais de cada membro do grupo societário, embora cada entidade continue a ter de apresentar declaração periódica individual, sendo com base nessas múltiplas declarações individuais que a sociedade dominante calcula o lucro tributável do grupo.
Sendo este o regime jurídico aplicável, não se vê em que termos é que pode configurar-se uma lacuna de regulação legal no que se refere à dedução dos benefícios fiscais de que as empresas eram já titulares quando transitaram para um grupo de sociedades. Com efeito, a lei estabelece como regra que, no âmbito do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções relativas a cada uma das sociedades são efetuadas no montante apurado relativamente ao grupo.
Também não se descortina a identidade de valoração jurídica entre a dedução de benefícios fiscais e o reporte de prejuízos fiscais que possa justificar o recurso à analogia. A limitação da dedução dos prejuízos fiscais, no que concerne aos prejuízos gerados em períodos de tributação anteriores à entrada num grupo societário, constitui uma norma anti abuso que visa evitar que, por via da opção pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades ou da alteração da composição do grupo societário, o resultado fiscal positivo do grupo possa ser influenciado negativamente pelos prejuízos fiscais cumulados anteriormente por empresas que passam a integrar o grupo, pelo que mal se compreenderia que esse mesmo critério fosse aplicado à dedução de benefícios fiscais quando estes visam compensar incentivos na área do investimento e da investigação e desenvolvimento empresarial que visam, essencialmente, promover o crescimento económico e o emprego e contribuir para o reforço da modernização e da competitividade do país.
Basta comparar as soluções vertidas em regimes de benefícios fiscais distintos para se concluir, forçosamente, que o legislador pressupõe necessariamente que a coleta individual não configura o limite aritmético natural do RETGS. No âmbito do IRC a pretensa matéria coletável individual das sociedades que integram um grupo abrangido pelo RETGS não tem relevância, apenas sendo de considerar a matéria coletável agregada do grupo, pelo que a aplicação da taxa de IRC, e as operações subsequentes de dedução à coleta assim apurada, apenas incidem sobre essa base.
Referências
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 021/22.2BALSB, de 21 de março de 2024
Código do IRC, artigos 71.º e 90.º n.º 2 alínea c) e n.º 6