O Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) decidiu que os rendimentos associados aos ativos negociados no âmbito dos seguros Unit Linked pertencem à seguradora, integrando a base tributável da mesma e estando sujeitos ao correspondente tratamento jurídico-fiscal.
O caso
No exercício de 2020, uma seguradora do ramo vida comercializou seguros, denominados Unit Linked, que constituem um produto do ramo vida associado a uma carteira de títulos adquiridos pela própria, em que o risco de investimento é suportado pelo tomador do seguro e a respetiva rentabilidade está dependente da evolução do valor desses títulos.
Para o feito constituiu provisões técnicas considerando o valor dos rendimentos afetos a esses seguros.
Alvo de uma inspeção tributária, da mesma resultaram correções à matéria coletável do ano de 2000, relacionadas com esses seguros Unit Linked.
Discordando dessas correções e da consequente liquidação adicional de imposto, a seguradora impugnou-a, com sucesso, tendo o tribunal determinado a anulação da liquidação adicional de IRC e a restituição do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios. Inconformada, a Fazenda Pública recorreu para o TCAS, defendendo que os rendimentos associados aos seguros Unit Linked não pertenciam à seguradora, mas sim ao tomador do segurador, pelo que não integravam a base tributável.
Apreciação do Tribunal Central Administrativo Sul
O TCAS negou provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida, ao decidir que os rendimentos associados aos ativos negociados no âmbito dos seguros Unit Linked pertencem à seguradora, integrando a base tributável da mesma e estando sujeitos ao correspondente tratamento jurídico-fiscal.
Os seguros Unit Linked, ou instrumentos de captação de aforro estruturados, combinam as características de um produto clássico com as de outro ou de outros instrumentos financeiros, formando um produto materialmente novo. Constituem, assim, um produto do ramo vida associado a uma carteira de títulos adquiridos pela própria seguradora, em que o risco de investimento é suportado pelo tomador do seguro e a respetiva rentabilidade está dependente da evolução do valor desses títulos
Os rendimentos das unidades de participação que as seguradoras detêm são tributados como proveitos ou ganhos em IRC e os montantes recebidos pelas seguradoras a título de lucros distribuídos pelas sociedades participadas são deduzidos no apuramento do lucro tributável.
O facto de a seguradora provisionar o montante dos dividendos distribuídos, por tal fazer parte das suas responsabilidades, não a impede de utilizar o mecanismo da eliminação da dupla tributação económica dos lucros distribuídos.
A seguradora não entrega as unidades de conta, que não têm existência nem valor fora desta relação. Entrega aquilo a que está obrigada e aquilo a que segurado tem direito, ou seja, o valor das unidades de conta no momento em que se extingue o contrato de seguro. Apenas nesse momento é que há um rendimento do beneficiário, pago pela seguradora.
Assim, quer em termos jurídicos, quer em termos económicos, não existe, no quadro dos seguros Unit Linked qualquer relação entre os sujeitos geradores dos rendimentos devidos pelas aplicações financeiras realizadas pela seguradora e o cliente desta titular daquele produto. Os segurados não compram, não vendem, não participam em perdas, não recebem dividendos. O sujeito é sempre a seguradora. São dela as obrigações comerciais e os direitos. Serão dela consequentemente, as obrigações tributárias ativas e passivas, pelo que os rendimentos que venha a obter por ser detentora de ações e unidades de participação são ganhos sujeitos a imposto, em concreto, a IRC. São, assim, ganhos incluídos na base tributável, sujeitos ao regime fiscal globalmente considerado, incluindo aos mecanismos de eliminação da dupla tributação económica.
Tendo as correções efetuadas assentado no pressuposto errado, defendido pela Fazenda Pública, de que os dividendos em causa não constituíam rendimento tributável da seguradora sujeitos às regras de tributação em sede de IRC, incorreram em erro de direito, pelo que o ato tributário que nelas se baseia deve ser anulado.
Referências
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19 de junho de 2024
Código do IRC, artigo 45.º
Estatuto dos Benefícios Fiscais, artigos 31.º e 32.º