1. Quando na petição inicial a identificação da pessoa contra quem a acção é instaurada é ambígua, até deliberadamente ambígua, em que numas passagens se afirma que a acção é intentada contra a sociedade X, e noutras se afirma que a acção é movida contra a sua sucursal, com estabelecimento sito na Rua Y, nº Z, e onde se alega que os actos foram praticados pela sucursal e o pedido é o de condenação da sucursal, é legítima a conclusão que o que o autor quis foi mesmo intentar a acção contra a referida sucursal.
2. Não existindo a referida sucursal, mas apenas um estabelecimento comercial da sociedade X, a conclusão óbvia é a que falece personalidade judiciária à ré.
3. Apesar do disposto no art. 14º CP, este vício não pode ser sanado, pois a forma como a petição inicial foi redigida, deliberadamente ambígua, introduziu no seio desta relação processual um “defeito genético”, que já contaminou várias decisões proferidas nos autos, e poderia contaminar muito mais no futuro.
4. O aceitar que a acção seguisse contra a sociedade X, nestas circunstâncias em que a autora estruturou toda a acção (incluindo para o efeito da competência do tribunal) com base no entendimento de que existia uma sucursal da ré e que era esta sucursal que pretendia demandar, afirmando expressamente que não estava a demandar a sociedade significava não apenas uma alteração formal da ré mas uma substituição da acção por outra, com diferente ré, diferente pedido e diferente causa de pedir.
5. Findando a acção na fase de saneamento por decisão de absolvição da instância, não faz sentido pretender a condenação da ré como litigante de má-fé, pois o Tribunal nem sequer começou a apreciar a substância da causa, nem as alegações feitas pelas partes sobre as pretensões deduzidas, e muito menos as provas apresentadas. Como tal, não é possível emitir um juízo sobre se alguma das partes litigou de má-fé.
6. Não é possível assentar a litigância de má-fé em interpretação de normas jurídicas, porque aí estamos em pleno domínio de opinião, ou de “entendimentos”, e é sabido que sobre as mesmas normas jurídicas é possível construir vários entendimentos, todos eles divergentes e apoiados por fragmentos jurisprudenciais ou doutrinários.
Processo n.º 4927/23.3T8BRG.G1