I - No âmbito do contrato de locação financeira, procedendo o locador à resolução do contrato, cinco anos após o incumprimento e quando todas as rendas já estão vencidas, sabendo-se que as rendas acordadas absorviam a quase totalidade da amortização do capital e dos juros inerentes ao crédito concedido por via da locação, deve proceder a resolução contratual, com a restituição do bem, mas limitar os efeitos da mesma, no que tange ao conteúdo puramente pecuniário da resolução, ao momento em que se verifica a falta de pagamento da renda.
II - Com efeito, quando o locador se apresta a resolver o contrato cerca de cinco anos após a data do incumprimento, e quando todas as rendas já estão vencidas, a aplicação da cláusula resolutiva não pode, sob pena de clamoroso abuso de direito, conduzir a uma solução que permita ao locador exigir do locatário as prestações que coincidem com a quase totalidade do cumprimento do contrato e, simultaneamente, manter-se proprietário do bem objeto de locação financeira.
III - A situação enquadra-se no abuso de direito na modalidade de desequilíbrio no exercício de posições jurídicas, traduzido no exercício de um direito que devido a circunstâncias extraordinárias dá origem a resultados totalmente estranhos ao que é admissível pelo sistema, quer por contrariar a confiança ou aquilo que o outro podia razoavelmente esperar, quer por dar origem a uma desproporção manifesta e objetiva entre os benefícios recolhidos pelo titular ao exercer o direito e os sacrifícios impostos à outra parte resultantes desse exercício.
Processo n.º 2197/23.2T8VNF-A.G1