I. No âmbito dos processos de jurisdição voluntária – como é o apadrinhamento civil (criado pela Lei n.º 103/2009, de 11-09, vulgo “LAC”) – , o princípio do inquisitório faz-se sentir com particular veemência, impondo-se ao juiz uma conduta proactiva na recolha de prova e apuramento de factos – alegados ou não alegados –, sempre no superior interesse da criança visada.
II. Ou seja, o juiz não está dependente de nenhum ónus de alegação pelos intervenientes, na precisa medida em que pode conhecer oficiosamente os factos, quer por investigação própria, quer na sequência de alegação dos interessados.
III. Daí que, estando confiada ao juiz a defesa do interesse da criança visada, a falta ou insuficiência de alegação de factos não pode, por si só e desacompanhada de outros fundamentos, justificar um indeferimento liminar.
IV. A figura do apadrinhamento civil é de aplicação subsidiária, apenas podendo ser aplicada caso não estejam reunidos os pressupostos da confiança com vista a adopção, ou, embora se reúnam em abstracto tais pressupostos, a adopção se mostre, em concreto, inviável.
V. Pode afirmar-se, enfaticamente, que uma criança que possa ser adoptada não deve ser apadrinhada; uma criança que possa ser apadrinhada, não deve ser adotada.
VI. Porém, neste tipo de situações, o ponto de partida – pressuposto incontornável, que permite equacionar uma solução permanente para a criança visada, maxime o seu apadrinhamento civil – é sempre o superior interesse da criança, a pressupor a existência de laços afectivos relevantes.
VII. Pelo que, a inviabilidade da adopção pode colocar-se não ao nível da probabilidade de determinada criança vir a ser adoptada, mas ao nível do seu superior interesse.
VIII. Como tal, pode, em abstracto, revelar-se contrário ao interesse de uma criança a negação da hipótese de ser apadrinhada por uma família com a qual vive, com a qual se identifica, pela qual nutre afecto e com a qual já criou um vínculo consistente.
Processo n.º 1467/24.7T8VFX.L1.S1