O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que, apurando-se a existência de uma possibilidade de vencimento da ação pelo cliente, mas não se apresentando esta com a consistência de uma vitória total, não se afigura desrazoável a atribuição de um valor correspondente a metade dos encargos que foi condenado a pagar, depois do advogado ter falhado na apresentação atempada da contestação.
O caso
Um cliente de um advogado intentou uma ação contra este e contra a respetiva seguradora responsabilizando-o pela perda de uma ação que fora intentada contra ele pelo Fundo de Garantia Automóvel com vista a obter o pagamento da quantia que pagara extrajudicialmente em sede de regularização de sinistro ocorrido em Espanha, no qual fora interveniente, com base na ausência de seguro de responsabilidade civil automóvel obrigatório válido e eficaz.
Em causa o facto de o advogado ter apresentado a contestação fora de prazo, o que culminara na sua condenação no pagamento de 12.959,78 euros.
A ação foi julgada parcialmente procedente, com a condenação do advogado e da seguradora no pagamento de 6.480 euros a título de indemnização, decisão da qual o mesmo recorreu para o TRP, pondo em causa o valor da indemnização.
O mesmo fez a seguradora, pedindo que o advogado fosse condenado no pagamento da franquia acordada no contrato de seguro, no valor de 5.000 euros.
Apreciação do Tribunal da Relação do Porto
O TRP negou provimento aos recursos, confirmando na totalidade a decisão recorrida, ao decidir que, apurando-se a existência de uma possibilidade de vencimento da ação pelo cliente, mas não se apresentando esta com a consistência de uma vitória total, não se afigura desrazoável a atribuição de um valor correspondente a metade dos encargos que foi condenado a pagar, depois do advogado ter falhado na apresentação atempada da contestação.
O dever de indemnização só existe quando, cumulativamente, se verifiquem os seguintes requisitos: a ilicitude do facto danoso; a culpa, sob forma, de dolo ou negligência do autor do facto e um nexo de causalidade entre o facto e os danos sofridos pelo lesado.
Sendo difícil sustentar a existência do nexo de causalidade adequada entre a apresentação extemporânea da contestação por parte do advogado e o dano final da perda da ação, poderá ser no entanto possível encontrar esse nexo quanto ao dano da perda de oportunidade de vencer resultante dessa falta de apresentação atendada da contestação.
Sendo a vitória judicial sempre de natureza incerta e tendo toda a causa um resultado aleatório, não é possível afirmar que a ação judicial teria sido julgada total ou parcialmente improcedente se tivesse sido atempadamente contestada, muito embora tenha ficado, irremediavelmente, comprometida a obtenção do benefício subordinado que se mostrava inerente ao êxito do procedimento judicial.
Terá de ser em função da maior ou menor probabilidade de vencimento, com recurso à equidade, que se poderá concluir pela verificação desse dano da perda de chance, mas terá sempre de haver alegação e prova de que esse vencimento era provável e possível. A perda de chance só poderá ser valorada em termos de uma possibilidade real de um êxito que se frustrou.
O julgamento hipotético, dito julgamento dentro do julgamento, assume, assim, quanto ao dano da perda da chance, uma dupla relevância, enquanto barómetro da aferição do pressuposto da causalidade adequada, mediante a afirmação da probabilidade séria do resultado favorável, e enquanto critério para a fixação equitativa do dano.
Quanto ao seguro obrigatório de responsabilidade civil, a previsão de uma franquia no contrato de seguro de responsabilidade civil profissional do advogado, celebrado entre tomador e seguradora, não é oponível ao lesado.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 23 de janeiro de 2025
Código Civil, artigos 563.º, 798.º e 799.º
Decreto-Lei n.º 72/2008 de 16/04, artigo 101.º