O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que necessita de uma medida protetora uma pessoa maior, com 88 anos, analfabeta e com um défice cognitivo ligeiro, que não consegue de forma autónoma levantar dinheiro e gerir a sua vida financeira corrente, beneficiando apenas do auxílio de uma vizinha.
O caso
Uma neta, residente em França, recorreu a tribunal pedindo o acompanhamento de maior da sua avó de 88 anos, pela outra neta, residente em Portugal, alegando que ela era analfabeta e que não estava em condições de gerir o seu dinheiro depois de ter enviuvado, uma vez que era o marido quem fazia essa gestão, temendo que ela fosse vítima de burlas ou deixasse de cumprir com as suas obrigações fiscais e financeiras. Mas a ação foi julgada improcedente, decisão da qual foi interposto recurso para o TRP.
Apreciação do Tribunal da Relação do Porto
O TRP julgou procedente o recurso, nomeando a neta como acompanhante da beneficiária, encarre de poderes de administração parcial dos seus bens, com exceção das aquisições necessárias à sua vida corrente.
Decidiu o TRP que necessita de uma medida protetora uma pessoa maior, com 88 anos, analfabeta e com um défice cognitivo ligeiro, que não consegue de forma autónoma levantar dinheiro e gerir a sua vida financeira corrente, beneficiando apenas do auxílio de uma vizinha.
O instituto do maior acompanhado consagra um novo paradigma, que rompe com o modelo monista anterior e que assenta na consagração de flexibilidade visando o apoio e benefício da pessoa.
Assim, não existe já, ao contrário do que estava estabelecido no regime anterior, a necessidade de ocorrer uma impossibilidade grave de exercício total de direitos, mas sim que a situação evidencie uma necessidade de decretamento de uma medida de acompanhamento entendida como uma medida de apoio, capaz de assegurar o bem-estar, a recuperação, o pleno exercício de todos os direitos e o cumprimento dos deveres do beneficiário.
O acompanhamento pode, assim, surgir como salvaguarda da pessoa que padeça de qualquer perturbação que diminua ou a prive da capacidade de, na sua plenitude, de modo autónomo corresponder ao exercício de direitos ou ao cumprimento dos seus deveres.
Nesses termos, se um pessoa com 88 anos, analfabeta e com um défice cognitivo ligeiro, não consegue de forma autónoma levantar dinheiro e gerir a sua vida financeira corrente, a mesma necessita de uma medida protetora. E se parte relevante do auxílio à mesma tem sido prestado por uma vizinha, não se pode considerar que as necessidades de apoio estejam acauteladas através de deveres gerais de assistência, pois não entre elas não existe qualquer relação de parentesco. Ainda assim, a limitação dos direitos deve ser a menor possível, na medida do estritamente necessário na situação concreta.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 22 de maio de 2025
Lei n.º 49/2018, de 14/08
Código Civil, artigos 138.º, 140.º, 143.º, 145.º e 147.º