O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que a acompanhante tem legitimidade para, em representação da sua irmã, maior acompanhada, requerer autorização para a venda do quinhão que esta detinha num imóvel pertencente à herança deixada pelos seus pais.
O caso
Uma mulher requereu autorização judicial para, em representação da sua irmã, proceder à venda do quinhão que ela detinha num imóvel que pertencia à herança deixada pelos seus pais, para depois aplicar o valor recebido com a venda em obras de restauro e melhoria da casa onde iam viver e o valor remanescente na compra de outro imóvel, para rendimento.
Para o efeito alegou que tinha sido nomeada acompanhante da sua irmã maior, que o imóvel tria um valor de mercado de cerca de 700.000 euros e que a venda era necessária para melhorarem as condições em que viviam.
Mas o tribunal indeferiu liminarmente a ação, considerando que a acompanhante não tinha poderes para a propor em representação da beneficiária, e fixou à ação o valor de 427.777,77 euros, correspondente à quota parte da beneficiária no valor do imóvel indicado como preço de venda.
Desta decisão foi interposto recurso para o TRP.
Apreciação do Tribunal da Relação do Porto
O TRP julgou procedente o recurso, ordenou o prosseguimento dos autos, para apreciação da pretensão da recorrente, e fixou o valor da ação em 272.222,22 euros.
Decidiu o TRP que a acompanhante tem legitimidade para, em representação da sua irmã, maior acompanhada, requerer autorização para a venda do quinhão que esta detinha num imóvel pertencente à herança deixada pelos seus pais.
Diz a lei que o acompanhante deve abster-se de agir em conflito de interesses com o acompanhado, requerendo ao tribunal a autorização das medidas tidas por convenientes quando a sua atuação seja necessária numa situação em que esse conflito surja.
Este dever de abstenção de atuação em conflito de interesses e consequente obrigação de solicitar ao tribunal a autorização para a prática de atos concretos aplica-se ao acompanhante, quer em caso de representação legal, quer de assistência.
No caso, a requerente e acompanhante encontrava-se numa posição de manifesto conflito de interesses com a sua irmã, de quem foi nomeada acompanhante, Pelo que legitimamente e cumprindo o dever que a lei lhe impõe, requereu a autorização para a prática de atos relacionados com a venda de imóvel integrante das heranças indivisas de que a própria e a acompanhada eram herdeiras.
Formulou, assim, uma pretensão legítima e própria, contida no âmbito das funções de acompanhante de que foi cometida, razão pela qual deve ser revogada a decisão de indeferimento liminar e prosseguirem os autos a sua normal tramitação.
Representando a pretensão formulada uma utilidade económica imediata correspondente ao valor de venda do imóvel, na proporção do respetivo quinhão da beneficiária, deve o valor da causa ser fixado de acordo com o valor de mercado do imóvel, na proporção do quinhão hereditário da beneficiária. Sendo essa proporção apenas de 7/18 avos, visto a falecida mãe ter doado à outra irmã, por conta da sua quota disponível, a meação nos bens comuns do casal e o quinhão hereditário que lhe pertencia na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito do seu marido, deve, no caso, o valor da causa ser fixado em 272.222,22 euros.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 12208/22.3T8PRT-A.P1, de 19 de fevereiro de 2024
Código Civil, artigo 150.º
Código de Processo Civil, artigo 296.º