O Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) decidiu que não é possível operar a redução de um negócio inválido por vício de forma.
O caso
Reclamando que um imóvel lhe tinha sido doado verbalmente pelo seu pai, entretanto falecido, e que desde 1984 que o habitava, uma das herdeiras recorreu a tribunal pedindo a redução dessa doação, relativamente à falta de forma, e o reconhecimento do direito de propriedade sobre o imóvel, por usucapião. As restantes herdeiras contestaram, tendo a ação sido julgada improcedente, decisão da qual foi interposto recurso para o TRC.
Apreciação do Tribunal da Relação de Coimbra
O TRC julgou improcedente o recurso ao decidir que não é possível operar a redução de um negócio inválido por vício de forma.
A redução supõe uma invalidade parcial do negócio, um vício que afete apenas alguma ou algumas das suas cláusulas, sendo válidas as restantes estipulações não afetadas por essa invalidade, podendo subsistir por si e mantendo-se o mesmo negócio. Sendo o vício de forma total, ficaria afastada a possibilidade ocorrer qualquer redução por não existir resto válido a salvaguardar. Esse vício de forma pode permitir a conversão do negócio nulo, mas nunca a sua redução. Não sendo defensável que, perante um negócio nulo, por falta de forma, o mesmo possa ser reduzido às declarações negociais constantes do mesmo, que deviam ser formalizadas e não o foram, para tornar válido o negócio, mesmo sem a necessária forma legal.
Quanto à aquisição do imóvel por usucapião, a posse, com certas características e mantida por certo lapso de tempo, pode conduzir à aquisição do direito de propriedade. Mas para que tal aconteça tem de existir, primeiramente, uma verdadeira posse. Ora a ocupação do imóvel com base na autorização do proprietário constitui uma situação de mera detenção, insuscetível de conduzir à sua aquisição por usucapião.
Também a realização de obras, o seu pagamento e o pagamento de impostos referentes ao imóvel são insuficientes para configurar uma situação de inversão do título da posse, necessária à aquisição por usucapião, especialmente quando exista relação familiar entre o proprietário e o detentor.
Por último, a norma que estabelece que o cônjuge sobrevivo tem direito a ser encabeçado, no momento da partilha, no direito de habitação da casa de morada da família e no direito de uso do respetivo recheio, devendo tornas aos co-herdeiros se o valor recebido exceder o da sua parte sucessória e meação, se a houver, não é analogicamente aplicável a outro herdeiro que tenha instalado a sua casa de morada de família em prédio integrado na herança indivisa.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo n.º 586/22.9T8PMS.C1, de 7 de maio de 2024
Código Civil, artigos 220.º, 221.º, 292.º, 947.º, 1263.º alínea d), 1265.º, 1287.º e 1290.º