O Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) decidiu que o Ministério Público (MP) não tem legitimidade para peticionar o cumprimento da prestação de alimentos devidos a filho maior.
O caso
O Ministério Público (MP) requereu que fosse decretado o incumprimento do exercício das responsabilidades parentais contra o pai de dois filhos, um deles entretanto já maior de idade, e ordenada a dedução mensal e sucessiva de 40 euros no seu vencimento mensal até integral pagamento da dívida e de 52 euros para pagamento dos alimentos vincendos devidos aos jovens, notificando-se, para o efeito, a entidade empregadora.
O pai declarou que nunca pagara os alimentos por não ter condições para o fazer, encontrando-se de baixa médica há cerca de três anos.
Mas o tribunal ordenou o desconto no seu vencimento das quantias indicadas pelo MP, decisão da qual o pai recorreu para o TRC alegando que o tribunal não considerara o facto de a filha ter atingido a maioridade e não ter comprovado que se encontrava a estudar, o que sempre importaria a declaração de cessação do pagamento da pensão de alimentos a esta e, igualmente, que não considerara o limite impenhorável da pensão de alimentos.
Apreciação do Tribunal da Relação de Coimbra
O TRC decidiu que o MP não tem legitimidade para peticionar o cumprimento da prestação de alimentos devidos a filho maior, absolvendo o requerido, nesta parte, da instância, tendo quando ao mais mantido a decisão recorrida, ordenando o desconto no vencimento do progenitor da quantia de 52 euros devidos como prestação de alimentos do filho menor, acrescida de 40 euros mensais para pagamento das prestações já vencidas.
Desde 2015 que a pensão fixada em benefício do filho durante a sua menoridade se mantém após a maioridade e até que ele perfaça os 25 anos.
Sendo que cabe ao progenitor, obrigado ao pagamento de alimentos ao filho menor, o ónus de intentar ação com vista à sua cessação, após a maioridade invocando para o efeito a ocorrência de um dos requisitos previstos na lei: a conclusão do processo de educação ou formação profissional do filho; a interrupção desse processo por ato voluntário do filho; ou a irrazoabilidade da exigência de alimentos ou a sua impossibilidade para os prestar.
Essa maioridade do credor de alimentos não obsta a que se possa recorrer aos mesmos meios coercitivos para a sua cobrança conferidos para proteção dos filhos menores. No entanto, a legitimidade para os peticionar cabe ao filho maior, credor destes alimentos, ou ao progenitor que assuma o encargo principal de pagar as despesas dos filhos maiores, e não ao MP. Assim, no caso, o MP apenas tinha legitimidade para peticionar os alimentos devidos na menoridade.
É aplicável aos créditos por alimentos os limites de impenhorabilidade previstos na lei, sendo impenhoráveis quantias equivalentes à totalidade da pensão social do regime não contributivo. Apesar deste limite, o tribunal pode sempre ajustar os descontos à real situação e necessidades dos progenitores e dos menores, salvaguardando limite superior ao mínimo legal, quando o julgue indispensável a assegurar a sobrevivência condigna do progenitor. Para tanto, não basta ao progenitor, devedor de alimentos, invocar que se encontra a receber subsídio de doença e que sobrevive com dificuldades, atendendo ao facto de este estado e subsídio ter natureza temporária e variável, o progenitor nunca ter pago qualquer quantia a título de alimentos aos seus filhos, durante mais de quatro anos, e a necessidade de ser assegurada uma subsistência condigna, sobretudo ao seu filho menor.
A intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos a Menores (FGADM) para que, em substituição do progenitor faltoso, assegure o pagamento da obrigação de alimentos deve ser requerida pelo MP ou por aqueles a quem a prestação de alimentos deveria ser entregue, em caso de impossibilidade de cobrança destes alimentos, e limita-se apenas às prestações que se vencerem após decisão que fixe o montante a pagar pelo FGADM.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo n.º 324/11.1TBCTB-G.C1, de 18 de junho de 2024
Lei n.º 122/2015, de 01/09
Código Civil, artigo 1905.º n.º 2
Regime Geral do Processo Tutelar Cível, artigos 41.º e 48.º
Código de Processo Civil, artigos 738.º n.º 4 e 989.º
Lei n º 75/98, de 19/11, artigos 1.º e 3.º