O Tribunal da Relação de Guimarães (TRG) decidiu que o acordo de partilhas, mesmo quando nulo por razões formais, pelo qual um herdeiro recebe o bem que fazia parte da herança de todos os demais herdeiros, é suscetível de alterar a detenção que este tinha desse bem em verdadeira posse, valendo como inversão do título de posse para efeitos de aquisição por usucapião.
O caso
Um herdeiro recorreu a tribunal pedindo para ser reconhecido como proprietário de metade de um prédio da herança alegando que o mesmo fora propriedade dos seus avós, que tinham deixado como herdeiros dois filhos, um deles, o seu pai, já falecido e a sua tia que tinha registado a totalidade do imóvel em seu nome.
Esta contestou alegando que o imóvel passara a pertencer-lhe por inteiro, na sequência de partilhas verbais que realizara com o seu irmão, comportando-se, desde então e há mais de 30 anos, como sua legítima proprietária, de forma ininterrupta, à vista de todos e sem oposição de ninguém, tendo, assim, adquirido a propriedade do prédio por usucapião.
O tribunal julgou a ação improcedente, decisão da qual foi interposto recurso para o TRG.
Apreciação do Tribunal da Relação de Guimarães
O TRG julgou totalmente improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida, ao decidir que o acordo de partilhas, mesmo quando nulo por razões formais, pelo qual um herdeiro recebe o bem que fazia parte da herança de todos os demais herdeiros, é suscetível de alterar a detenção que este tinha desse bem em verdadeira posse, valendo como inversão do título de posse para efeitos de aquisição por usucapião.
Não vale pela sua força negocial, mas por implicar, de facto, uma alteração do título de posse, perante os herdeiros. Assim, decorrido que seja o prazo da usucapião, esse herdeiro adquire o bem por força desse título.
A usucapião é a constituição, facultada ao possuidor, do direito real correspondente à sua posse, desde que esta, dotada de certas características, se tenha mantido pelo lapso de tempo determinado na lei.
Ora, para o efeito, diz a lei que a inversão do título da posse, enquanto constituição da posse por parte do mero detentor, pode dar-se por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía ou por ato de terceiro capaz de transferir a posse.
Sendo entendimento da jurisprudência que a partilha verbal, mesmo que juridicamente irrelevante, faz inverter o título da posse, de tal modo que cada herdeiro passa a ter uma posse exclusiva sobre certa parte determinada da herança, possibilitando, assim, a aquisição por usucapião dos imóveis que lhe tenham sido entregues.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no processo n.º 148/23.3T8PTB.G1, de 20 de março de 2025
Código Civil, artigos 1251.º, 1252.º, 1253.º, 1255.º, 1257.º, 1265.º e 1297.º