O Tribunal da Relação de Évora (TRE) decidiu que, em ação de divórcio, as declarações de uma das partes que sejam contrárias ao seu interesse não podem ser atendidas como confissão, por respeitarem a factos relativos a direitos indisponíveis, mas podem ser valoradas livremente pelo tribunal.
O caso
Um homem requereu o divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, alegando factos que em seu entender consubstanciavam a rutura definitiva do casamento e pedindo a retroação dos efeitos do divórcio a novembro de 2022.
Na pendência do divórcio e logo depois de se ter completado um ano sobre a data da separação de facto do casal, apresentou articulado superveniente requerendo a ampliação da causa de pedir e do pedido, no sentido de o divórcio ser decretado também com fundamento nessa separação.
Antes de proferido despacho sobre a admissibilidade do articulado superveniente, a mulher contestou e reconveio, alegando que ele tinha saído de casa em novembro de 2022, data a partir da qual não mais existira partilha de vida entre os cônjuges.
O tribunal admitiu o pedido reconvencional, tendo o autor pedido o depoimento de parte da mulher e esta, por sua vez, o depoimento de parte do marido. O tribunal não admitiu os depoimentos de parte, decisão da qual o autor recorreu para o TRE.
Apreciação do Tribunal da Relação de Évora
O TRE julgou parcialmente procedente o recurso, admitindo o depoimento de parte e mantendo nos autos a reconvenção.
Decidiu o TRE que, em ação de divórcio, as declarações de uma das partes que sejam contrárias ao seu interesse não podem ser atendidas como confissão, por respeitarem a factos relativos a direitos indisponíveis, mas podem ser valoradas livremente pelo tribunal.
De facto, embora o depoimento de parte desfavorável a quem o presta não possa ter o valor de uma confissão, nada impede que esse depoimento possa ser requerido pela contraparte com vista, não à confissão, mas à aquisição de factos pertinentes para verdade material e boa decisão da causa e que seja livremente apreciado pelo tribunal.
Deve, portanto, julgar-se perfeitamente admissível a valoração do depoimento de parte, no segmento em que não produz confissão, à luz da livre apreciação do tribunal, como sempre sucederá, de resto, no caso de ação relativa a direitos indisponíveis em que a confissão se tem por inadmissível.
No que diz respeito à admissão da reconvenção, a ré também pode pedir o divórcio, como o fez em reconvenção, devendo esta ser admitida.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido no processo n.º 2138/23.7T8PTM-A.E1, de 10 de julho de 2025
Código Civil, artigos 354.º e 361.º
Código de Processo Civil, artigo 453.º n.º 2