Foi hoje publicada a lei que altera o regime da constituição e funcionamento das sociedades de profissionais sujeitas a associações públicas profissionais (APP).
O diploma entra em vigor a 19 de março de 2024.
O regime passa a integrar um novo capítulo XI com a epígrafe «Sociedades multidisciplinares de profissionais».
Para as sociedades de profissionais constituídas antes de 19 de março 2024 prevê-se uma norma transitória segundo a qual devem adotar as novas regras até 19 de maio de 2024 e adaptar os estatutos da respetiva associação pública profissional.
O regime da constituição e funcionamento das sociedades de profissionais sujeitas a APP aplica-se também à constituição de cooperativas de profissionais sujeitos a APP, a par do Código Cooperativo (com as necessárias adaptações).
NOVAS SOCIEDADES MULTIDISCIPLINARES
Registo de sociedades multidisciplinares
As sociedades multidisciplinares têm de se inscrever na associação pública profissional respetiva e só depois podem iniciar o exercício da atividade profissional relativa a uma profissão organizada em associação pública profissional.
Estas sociedades têm também de se inscrever num registo central, ainda a regular por portaria do membro do Governo responsável pela área da administração pública, que será de acesso público e consultável pelas APP.
Sociedades multidisciplinares
Define-se sociedade multidisciplinar de profissionais como a sociedade de profissionais, constituída nos termos deste regime, que se estabeleça em território nacional para o exercício de profissões organizadas em associações públicas profissionais, juntamente com outras profissões organizadas ou não em associações públicas profissionais.
Estas sociedades podem integrar, no respetivo objeto social, o exercício de atividades profissionais organizadas em associações públicas profissionais ou de outras profissões organizadas ou não em associações públicas profissionais, desde que seja observado o regime de incompatibilidades e impedimentos previsto na lei aplicável.
Constituição de sociedades multidisciplinares de profissionais
Podem ser constituídas sociedades multidisciplinares de profissionais para exercício de profissões organizadas em APP, juntamente com outras profissões organizadas ou não em APP, quando, cumulativamente:
- garantam, estatutária e funcionalmente, o cumprimento dos regimes de incompatibilidades e impedimentos aplicáveis;
- garantam procedimentos e mecanismos destinados a identificar, evitar, gerir, acompanhar e divulgar a ocorrência de conflitos de interesses, designadamente entre os interesses dos seus clientes e os interesses dos seus sócios, titulares dos órgãos da sociedade, trabalhadores e prestadores de serviços;
- os responsáveis pela orientação e execução de funções de interesse público sejam profissionais qualificados;
- garantam a independência técnica, a proteção de informação de clientes e a observância, incluindo pelos sócios, dos deveres deontológicos aplicáveis a cada atividade profissional desenvolvida e em conformidade com a lei;
- disponham de um sistema interno de salvaguarda do sigilo profissional;
- garantam uma função permanente de controlo de risco com competência para implementar a política e os procedimentos de gestão de riscos de incompatibilidades, impedimentos, conflitos de interesses, a independência técnica e a proteção de informação de clientes e de salvaguarda do sigilo profissional.
Composição de sociedades multidisciplinares de profissionais
Os sócios das sociedades multidisciplinares de profissionais devem compor a maioria dos membros dos órgãos de administração e gerência das respetivas sociedades.
De entre os sócios da sociedade multidisciplinar de profissionais deve figurar, pelo menos, um membro de cada profissão organizada em associação pública cuja atividade integre o objeto da respetiva sociedade.
Sócios e administradores
Podem ser sócios profissionais, gerentes ou administradores as pessoas físicas que reúnam os requisitos para o exercício das atividades profissionais que integrem o objeto social e as exercem na mesma sociedade.
Podem ser sócios, gerentes ou administradores das sociedades multidisciplinares de profissionais as pessoas físicas que não possuam as qualificações profissionais exigidas para o exercício das profissões organizadas na associação pública profissional respetiva, ficando vinculados aos deveres deontológicos aplicáveis ao exercício das profissões abrangidas, designadamente aos deveres de sigilo, quando existam, e às jurisdições e regimes disciplinares das associações públicas profissionais a que respeitam as atividades que integram o respetivo objeto social.
As funções de orientação e de controlo da atividade funcional prestada à sociedade pelos sócios e colaboradores inscritos nas associações públicas profissionais devem ser, igualmente, asseguradas por profissionais que integrem essas associações.
Estrutura orgânica e funcional
Aplica-se o regime geral (com as necessárias adaptações) em tudo o que não estiver regulado no capítulo relativo à dissolução, liquidação e partilha da sociedade de profissionais, designadamente nas matérias relativas à forma e regime societário, bem como à estrutura orgânica e funcional das sociedades multidisciplinares de profissionais.
Quando deixem de estar verificados os requisitos legais relativos à composição dos órgãos de gerência e administração, os órgãos sociais devem, no prazo de seis meses, adotar as medidas necessárias à sanação da irregularidade.
No caso de inobservância desta regra aplica-se, com as necessárias adaptações, o procedimento administrativo de dissolução estabelecido no diploma que define o regime jurídico da dissolução e da liquidação de entidades comerciais.
Deveres
Todos aqueles que exerçam funções na sociedade multidisciplinar de profissionais estão:
- vinculados aos seguintes deveres:
- de lealdade,
- de confidencialidade,
- de sigilo profissional,
- de prevenção de conflitos de interesses,
- aos deveres deontológicos que correspondam ao exercício de cada profissão organizada em associação pública cuja atividade integre o objeto da respetiva sociedade,
e
- sujeitos à jurisdição e regime disciplinares da respetiva associação pública profissional.
Estas obrigações não obstam à partilha, entre aqueles, das informações necessárias à organização do trabalho e à realização de atos profissionais no interesse dos clientes.
Controlo de risco
O órgão de gestão da sociedade deve garantir a recusa e a cessação das prestações de serviços a clientes suscetíveis de gerar conflitos de interesses.
A função permanente de gestão dos riscos é hierárquica e funcionalmente independente do órgão de gestão e das unidades operacionais, não podendo ser exercida por membro daquele órgão, exceto se tal não for adequado e proporcional face à natureza, à escala e à complexidade da atividade da sociedade.
Tem a autoridade necessária e acesso a toda a informação relevante para efeitos de cumprimento dos deveres acima referidos.
A função permanente de controlo de risco tem as seguintes competências:
- implementar a política e os procedimentos de gestão de riscos de incompatibilidades, impedimentos, conflitos de interesses, a independência técnica e a proteção de informação de clientes e de salvaguarda do sigilo profissional;
- analisar potenciais situações de incompatibilidades, impedimentos, conflitos de interesses, riscos para a independência técnica e a proteção de informação de clientes e de salvaguarda do sigilo e propor ao órgão de gestão da sociedade a recusa e a cessação da prestação de serviços suscetíveis de gerar aquelas situações;
- transmitir ao órgão de gestão todas as situações suscetíveis de gerar incompatibilidades, impedimentos, conflitos de interesses, riscos para a independência técnica e a proteção de informação de clientes e de salvaguarda do sigilo;
- fornecer relatórios regulares ao órgão de gestão sobre os procedimentos de gestão de riscos de incompatibilidades, impedimentos, conflitos de interesses, para a independência técnica e a proteção de informação de clientes e de salvaguarda do sigilo.
Responsabilidade solidária
As sociedades e os sócios são solidariamente responsáveis pela inobservância das regras deontológicas pelos profissionais e colaboradores que exerçam as respetivas atividades na sociedade multidisciplinar de profissionais, ficando sujeitos à jurisdição e regime disciplinares da associação pública profissional a que respeite a atividade que haja dado causa à infração.
A sociedade multidisciplinar de profissionais deve celebrar um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional.
OUTRAS ATERAÇÕES AO REGIME DAS SOCIEDADES DE PROFISSIONAIS SUJEITAS A APP
Âmbito do regime
Assim, o regime das sociedades de profissionais sujeitas a associações públicas profissionais (APP) passa a aplicar-se a:
- sociedades de profissionais e entidades equiparadas estabelecidas em território nacional que tenham por objeto principal o exercício em comum de atividades profissionais organizadas numa única associação pública profissional;
Entende-se por exercício em comum de atividades profissionais organizadas a prestação de serviços profissionais através de pessoa coletiva constituída nos termos desta lei.
- sociedades multidisciplinares de profissionais que, nos termos do novo capítulo XI, se estabeleçam em território nacional para o exercício de profissões organizadas em associações públicas profissionais, juntamente com outras profissões organizadas ou não em associações públicas profissionais.
A sociedade multidisciplinar de profissionais é a sociedade de profissionais, constituída nos termos deste regime, que se estabeleça em território nacional para o exercício de profissões organizadas em associações públicas profissionais, juntamente com outras profissões organizadas ou não em associações públicas profissionais.
Aplica-se também a sociedades de revisores oficiais de contas e demais sociedades de profissionais regidas pelo direito da União Europeia, na medida em que não contrarie a legislação que lhes é especialmente aplicável, como já se previa na lei.
Continua a não se aplicar às pessoas coletivas que, não sendo sociedades de profissionais ou entidades equiparadas, prestem serviços profissionais através de profissionais seus sócios, administradores, gerentes ou seus colaboradores.
Objeto social
O objeto social das sociedades multidisciplinares de profissionais é integrado no regime.
Estas sociedades podem integrar, no respetivo objeto social, o exercício de atividades profissionais organizadas em associações públicas profissionais ou de outras profissões organizadas ou não em associações públicas profissionais, desde que seja observado o regime de incompatibilidades e impedimentos previsto na lei aplicável.
Responsabilidade disciplinar
As sociedades de profissionais e as organizações associativas de outros Estados membros respondem disciplinarmente perante a associação pública profissional em que se encontram inscritas, nos termos da legislação que rege a atividade em causa.
Transformação em sociedade de profissionais
As regras aplicáveis à firma aplicam-se também, com as devidas adaptações, às sociedades de regime geral que se transformem em sociedades de profissionais.
Fusão de sociedades
É permitida a fusão de duas ou mais sociedades de profissionais, mediante a sua reunião numa única sociedade.
A fusão pode realizar-se pelas formas já previstas:
- mediante a transferência global do património de uma ou mais sociedades para outra e atribuição aos sócios daquela de participações da sociedade incorporante, de indústria e ou de capital;
- mediante a constituição de uma nova sociedade, para a qual se transferem globalmente os patrimónios das sociedades fundidas, sendo aos sócios destas atribuídas participações de indústria ou de capital na nova sociedade.
No projeto de fusão, as administrações das sociedades que pretendam fundir-se devem elaborar, em conjunto, um projeto de fusão, do qual deve constar, para além dos restantes elementos previstos, a firma, a sede e o montante do capital de cada uma das sociedades.
Cisão de sociedades
As sociedades de profissionais podem destacar partes do seu património ou dissolver-se, dividindo o seu património em duas ou mais partes, para as fundir com sociedades de profissionais já existentes ou com partes do património de outras sociedades de profissionais, separadas por idênticos processos e com igual finalidade.
Deixa de se prever a obrigação de estarem todas sujeitas à mesma associação pública profissional.
Contrato de fusão ou cisão, registo e inscrição das sociedades emergentes
A celebração do contrato de fusão ou cisão deixa de depender do controlo prévio do respetivo projeto pela associação pública profissional.
Uma vez celebrado o contrato, deve ser requerida a inscrição da fusão ou cisão no registo.
Transformação, fusão e cisão
Segundo as novas regras, as sociedades de profissionais podem transformar-se em sociedades multidisciplinares de profissionais, em sociedades de regime geral, ou
fundir-se e cindir-se sem observância do disposto nas regras comuns em matéria de fusão e cisão.
Nestes casos, perdem a natureza de sociedade de profissionais.
Modalidades de associação societária
As sociedades de profissionais podem associar-se a outras sociedades, sejam estas sociedades de profissionais ou não, para o exercício em conjunto de atividades que não sejam incompatíveis entre si, observado o regime de impedimentos aplicável, nos termos gerais.
Deixa aqui de se exigir que assumam as modalidades previstas de consórcio, associação em participação, agrupamento complementar de empresas ou agrupamento europeu de interesse económico.
Não é ainda exigível às associações que incluam sociedades de profissionais não deixem de ser membros das associações públicas profissionais a que aquelas sociedades estejam sujeitas, nem estão em si mesmas sujeitas a responsabilidade disciplinar.
Dissolução
A sociedade de profissionais é dissolvida nos casos previstos na lei e no contrato de sociedade.
A sociedade de profissionais é ainda dissolvida extrajudicialmente:
- se se verificar a continuada violação dos requisitos para a sua constituição;
- quando lhe for aplicada pena disciplinar de expulsão da respetiva associação profissional ou interdição definitiva do exercício da atividade profissional.
Esta regra não é aplicável às sociedades multidisciplinares de profissionais.
São revogadas as normas que estipulam:
- a mera comunicação pela sociedade em caso de dissolução à respetiva associação pública profissional; e
- quando seja aplicada pena disciplinar de expulsão esta seja decretada pela associação pública profissional, uma vez observado o princípio do contraditório, a qual promove o respetivo registo
Referências
Lei n.º 64/2023 - DR n.º 224/2023, Série I de 20.11.2023
Lei n.º 53/2015 - DR n.º 112/2015, Série I de 2015-06-11, artigos 2.º, 3.º, 7.º, 18.º, 26.º, 39.º, 40.º, 41.º, 45.º, 47.º, 48.º e 50.º; novos artigos 52.º-A a 52.º-I