O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que a empresa a quem não foi adjudicado, em concurso público, o uso privado do domínio público para efeitos publicitários, não tem legitimidade ativa para impugnar a decisão da Autoridade da Concorrência (AdC) que não se opôs a essa adjudicação a uma outra empresa, no quadro de um procedimento relativo a operações de concentração de empresas, ainda que a tenha sujeitado a condições e a obrigações especiais, quando não demonstre possuir um interesse direto e pessoal decorrente da impugnação do ato administrativo.
O caso
O município de Lisboa promoveu um concurso público para concessão de uso privativo do domínio público do município para instalação e exploração publicitária de mobiliário urbano tendo em vista a celebração de um contrato de concessão de uso privativo de domínio público do município para instalação e exploração publicitária de Mupis, Abrigos e Sanitários.
Após a adjudicação feita a uma das concorrentes, foram apresentadas denúncias de que essa adjudicação conduziria a uma situação de concentração sujeita a notificação prévia ao abrigo do Regime Jurídico da Concorrência.
A Autoridade da Concorrência (Adc) considerou verificada essa situação passível de resultar na criação ou reforço de entraves significativos à concorrência efetiva no mercado da publicidade exterior em displays de pequeno formato, mas, depois de a empresa ter assumido compromissos de subcontratação, decidiu não se opor à sua contratação, o que levou a que uma outra empresa concorrente recorresse a tribunal impugnando essa decisão e pedindo a sua anulação ou declaração de nulidade.
O tribunal entendeu que a essa empresa carecia de interesse em agir, decisão da qual foi interposto recurso para o TRL.
Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa
O TRL julgou totalmente improcedente o recurso, ao decidir que a empresa a quem não foi adjudicado, em concurso público, o uso privado do domínio público para efeitos publicitários não tem legitimidade ativa para impugnar a decisão da AdC que não se opôs a essa adjudicação a uma outra empresa, no quadro de um procedimento relativo a operações de concentração de empresas, ainda que a tenha sujeitado a condições e a obrigações especiais, quando não demonstre possuir um interesse direto e pessoal decorrente da impugnação do ato administrativo.
Nas ações de impugnação, o autor tem legitimidade caso apresente um interesse direto e pessoal em anular o ato administrativo, designadamente por ser titular de um direito ou de um interesse legalmente protegido.
Existe interesse pessoal quando a anulação se repercuta na esfera jurídica do titular do direito ou do interesse legalmente protegido e interesse direto quando a utilidade ou o benefício decorre, de modo imediato, da procedência do pedido de declaração de invalidade do ato administrativo.
Não se encontra preenchido o pressuposto processual de legitimidade ativa nos casos em que o autor pretende satisfazer, através da interposição da ação de impugnação do ato administrativo, um interesse considerado remoto, longínquo, hipotético ou eventual.
No caso, não se vislumbra que a autora pudesse vir a obter alguma vantagem ou utilidade pessoal e imediata decorrente da procedência do pedido de anulação ou de declaração de nulidade da decisão da AdC, que não se opôs à adjudicação, determinada pela Câmara Municipal de Lisboa, do uso privado do domínio público, dentro da área do município de Lisboa, para instalação e para exploração de publicidade em mobiliário urbano, ainda que tenha sujeitado essa operação a condições e a obrigações.
A eventual procedência da ação de impugnação determinaria unicamente a substituição do ato administrativo viciado por outro, sem atribuir ou sem reconhecer à autora um direito ou interesse direto e pessoal, muito em particular a qualidade de adjudicatária do concurso. A esfera jurídica da mesma permaneceria intocada, ou seja, não sofreria qualquer alteração, decorrente da anulação ou da declaração de nulidade do ato administrativo em causa.
Naturalmente que tem a expectativa de, através da pretendida anulação ou da declaração de nulidade, ver revista a solução anteriormente preconizada pela AdC ou que, porventura, seja manifestada oposição à adjudicação atribuída à empresa vencedora do concurso. Todavia, trata-se de um interesse indireto, remoto, diferido e hipotético, que nunca resultaria satisfeito pela decisão do tribunal e que, por isso, se mostra insuficiente para efeitos de atribuição de legitimidade ativa à autora.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de outubro de 2024
Código de Processo nos Tribunais Administrativos, artigo 55.º n.º 1 alínea a)