Para evitar que as medidas de apoio ao impacto dos incêndios tenham de ser precedidas de declarações de alerta ou calamidade, o Governo aprovou um regime jurídico que rege as medidas apoio a aplicar, no tempo e espaço a definir a cada momento, mediante uma resolução do Conselho de Ministros. O diploma entra em vigor hoje, 25 de agosto, mas produz efeitos a 1 de julho.
O novo quadro normativo inclui seis áreas temáticas complementares: pessoas, habitação, atividades económicas, agricultura, ambiente, conservação da natureza e florestas, e infraestruturas e equipamentos – com os respetivos apoios e medidas de contratação pública para a administração central e local.
Este regime «geral» aplica-se a incêndios rurais de elevada dimensão ou gravidade, conforme seja definido por resolução do Conselho de Ministros que fixe os âmbitos temporal e geográfico.
APOIOS À HABITAÇÃO
O regime prevê apoios à reconstrução ou reabilitação de habitações permanentes e alojamento urgente e temporário. Os apoios visam habitações legalizadas urbanisticamente ou suscetíveis de legalização.
Os apoios abrangem:
- a construção, reconstrução, reabilitação, ampliação, demolição, aquisição e arrendamento de imóveis destinados a habitação própria e permanente, afetados pelos incêndios, assim como o seu apetrechamento;
- o fornecimento dos equipamentos necessários aos referidos imóveis, incluindo mobiliário básico, eletrodomésticos essenciais e utensílios domésticos indispensáveis para a habitabilidade;
- o alojamento urgente e temporário. É aplicável o procedimento especial simplificado, previsto no Programa Porta de Entrada para soluções de alojamento temporário.
A prova de que o imóvel afetado pelo incêndio se destina à sua habitação própria e permanente é efetuada através dos seguintes documentos:
- certidão de registo predial ou caderneta predial do imóvel, na qual o beneficiário conste como proprietário, e comprovativo do domicílio fiscal do proprietário.
- em caso de impossibilidade de apresentação de certidão do registo predial ou caderneta predial, o beneficiário do apoio deverá apresentar-se perante conservador ou notário, acompanhado de três testemunhas que atestem a referida propriedade, exarando-se essas declarações em documento autêntico e sendo dado conhecimento ao beneficiário e às testemunhas de que poderão incorrer no crime de falsas declarações. O documento autêntico lavrado na sequência deste procedimento é suficiente para a concessão dos apoios, desde que seja objeto de ampla divulgação no município a que respeita a habitação, através de edital em lugares de estilo e online, no site do respetivo município.
- prova da residência habitual pode ser feita através da certidão de domicílio fiscal, contrato de arrendamento para habitação no qual o beneficiário conste como locatário e comprovativo do domicílio fiscal ou da confirmação por três testemunhas residentes na localidade, prestada nos mesmos termos acima indicados.
A construção, reconstrução, reabilitação, ampliação, aquisição ou arrendamento das habitações é efetuada pelas autarquias locais ou pelos respetivos proprietários, no prazo de dois anos a contar da data da notificação da aprovação da candidatura pela CCDR, se o incumprimento não for imputável ao beneficiário do apoio.
Os apoios à habitação são os seguintes:
Obras:
- comparticipação a 100% até 250 mil euros, nos termos da avaliação conjunta da CCDR e autarquia;
- comparticipação a 85% no montante que exceda os 250 mil euros, nos termos da avaliação.
A avaliação necessária inclui uma estimativa sobre o valor do fornecimento dos equipamentos necessários às habitações, incluindo mobiliário básico, eletrodomésticos essenciais e utensílios domésticos indispensáveis para a habitabilidade, considerando a reposição dos bens nela existentes imediatamente antes da ocorrência dos incêndios.
É admitida a ampliação até 10% da área de construção e da altura da fachada da edificação original, desde que, no projeto, fique demonstrada a necessidade da mesma para assegurar a correção de más condições de segurança, salubridade, eficiência térmica ou acessibilidades da edificação, sem prejuízo dos instrumentos de gestão territorial diretamente aplicáveis.
O apoio é pago da seguinte forma:
- 50% entregue ao proprietário ou ao município, caso o último seja responsável pela execução da obra, mediante a celebração do contrato de comparticipação;
- 40% entregue após apresentação dos recibos que comprovem despesas que excedam o montante;
- 10% entregue no final da obra, com a apresentação do relatório conjunto CCDR/ município e do comprovativo do qual resulte o registo da propriedade do imóvel a favor do beneficiário do apoio.
Rendas:
- comparticipação a 100% para arrendamento, considerando a diferença entre a renda praticada no mês anterior à ocorrência dos incêndios e a renda a comparticipar, limitada pelo valor da mediana das rendas praticadas no concelho onde se insere a habitação, no trimestre anterior à ocorrência dos incêndios.
A disponibilização do montante depende da apresentação de apólice de seguro válida que incida sobre o respetivo imóvel e que cubra o risco de danos provocados por incêndios.
A comparticipação mensal é concedida por um prazo máximo de cinco anos. Não havendo alternativa habitacional, a situação pode ser sinalizada pelo município como especialmente vulnerável para efeito de acesso a uma solução habitacional ao abrigo do 1.º Direito - Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, desde que preencha os demais requisitos de elegibilidade.
Casos de habitações ilegais e de inviabilidade da reconstrução
No caso de habitações próprias e permanentes danificadas situadas em locais que violem as regras urbanísticas aplicáveis e que não sejam suscetíveis de legalização, bem como de imóveis danificados que não sejam suscetíveis de legalização, os imóveis são demolidos pelos municípios, sendo que os custos correm por conta do apoio concedido.
Em caso de inviabilidade da reconstrução ou manutenção da habitação própria e permanente dos beneficiários no mesmo local, nomeadamente por razões de tutela de legalidade urbanística e de controlo especial de riscos, incluindo quando os imóveis antes da ocorrência dos danos causados pelos incêndios não eram suscetíveis de legalização, o apoio concede-se para aquisição de nova habitação ou, caso tal se revele inviável, para a construção de nova habitação no mesmo concelho.
APOIOS ÀS FAMÍLIAS EM SITUAÇÃO DE CARÊNCIA OU DE PERDA DE RENDIMENTO
- famílias em situação de carência ou perda de rendimento: são concedidos apoios às famílias que se encontrem em situação de carência ou perda de rendimento e que necessitem de proceder à realização de despesas necessárias à sua subsistência ou à aquisição de bens imediatos e inadiáveis, através da atribuição de subsídios de carácter eventual, de concessão única ou de manutenção. Incluem-se apoios eventuais ou excecionais de carácter pecuniário ou em espécie, a atribuir nas situações de comprovada carência económica decorrente de incêndios rurais.
- agricultores afetados diretamente pelos incêndios rurais: concedidos apoios para aquisição de bens imediatos e inadiáveis, alimentação animal e para recuperação da economia de subsistência e perda de rendimentos por motivo diretamente causado pelos incêndios.
- instituições particulares de solidariedade social: concede-se apoios às IPSS e equiparadas que levem a cabo ações de solidariedade dirigidas aos territórios e populações afetadas pelos incêndios rurais.
AMBIENTE - RESTABELECIMENTO DOS ECOSSISTEMAS E DA FLORESTA
Estão previstos:
- um apoio extraordinário para a substituição ou reparação de máquinas e equipamentos florestais, armazéns e outras construções de apoio às atividades florestais afetadas pelos incêndios.
- um apoio extraordinário às entidades gestoras de zonas de caça que foram diretamente afetadas pelos incêndios, para assegurar a realização de ações de recuperação de habitat, recuperação da sinalização ardida e de infraestruturas afetadas diretamente relacionadas com a gestão das zonas de caça. Estas entidades com territórios cinegéticos afetados pelos incêndios são isentas do pagamento das taxas anuais relativas ao ano em que se verificaram os incêndios, assim como ao ano subsequente.
- um apoio extraordinário às comissões de cogestão de áreas protegidas para implementarem medidas de recuperação de linhas de água, infraestruturas danificadas, contenção de solos e restauro ecológico.
- um apoio extraordinário às entidades gestoras de baldios que foram diretamente afetadas pelos incêndios, para assegurar a realização de ações de recuperação da biodiversidade, reflorestação e recuperação de infraestruturas.
- medidas com vista à recuperação de áreas protegidas e de infraestruturas afetadas, o controlo de erosão, tratamento e proteção de encostas, a prevenção da contaminação, assoreamento e recuperação de linhas de água, a prevenção de riscos para a conservação da natureza e biodiversidade e de promover estruturas de suporte à manutenção da vida selvagem.
O ICNF pode, através do Fundo Ambiental, aumentar o apoio ao funcionamento das equipas de sapadores florestais que devem cumprir excecionalmente mais dias de serviço público.
ACOMPANHAMENTO ÀS VÍTIMAS PELO SNS
Os cuidados de saúde previstos são gratuitos e abrangem, nomeadamente:
- isenção de taxas moderadoras, quando aplicáveis de acordo com a legislação em vigor;
- dispensa gratuita de medicamentos, produtos tópicos e ajudas técnicas, pelas unidades de saúde do SNS;
- gratuitidade do transporte de doentes para a deslocação a consultas, tratamentos e meios complementares de diagnóstico e terapêutica.
Os cuidados de saúde incluem, na maioria no prestados nas Unidades Locais de Saúde (ULS):
- cuidados de saúde primários e consultas de especialidade necessárias, para garantir resposta a doença aguda, gestão da doença crónica e eventuais descompensações;
- intervenções de apoio em saúde mental às populações, por parte das unidades de cuidados de saúde primários ou serviços de saúde mental;
- vigilância epidemiológica, particularmente de doenças respiratórias;
- medidas para mitigar o impacto do incêndio na saúde, nomeadamente nos mais vulneráveis, como as crianças, as grávidas, os idosos e os doentes com patologias crónicas, com acompanhamento e prestação de cuidados necessários.
Como se operacionalizam os apoios
Os apoios são concedidos pela CCDR territorialmente competente, quando não se preveja outra entidade específica. A CCRN coordena a aplicação dos apoios e gere as disponibilidades financeiras, sem prejuízo da responsabilidade direta das autarquias locais. Para a atribuição e gestão dos apoios a conceder são celebrados protocolos de colaboração entre as CCDR e as autarquias locais ou empresas do setor público empresarial.
São consideradas elegíveis as despesas efetuadas ao abrigo da resolução do Conselho de Ministros que define as áreas afetadas, desde que devidamente documentadas através de fatura. Salvaguarda-se a possibilidade de estarem previstas outras formas de comprovação de despesas elegíveis, em regulamentação específica.
Quanto aos prazos para candidaturas, os beneficiários elegíveis terão 8 meses contados desde o início do período temporal fixado na resolução do Conselho de Ministros, para apresentar candidatura.
Junto de cada município abrangido pelo âmbito geográfico funciona um Balcão de apoio sob a responsabilidade do município, que disponibiliza os formulários de acesso aos apoios da CCDR. Os formulários e a informação referente aos apoios são disponibilizados online.
Como são apurados os danos
As autarquias locais recolhem, registam e reportam à CCDR territorialmente competente os dados relativamente aos danos apurados. Em vistoria conjunta, os técnicos dos municípios e da CCDR definem a estimativa do valor dos danos decorrentes dos incêndios, sem prejuízo das metodologias próprias de estimativa de danos que, em função da especificidade das situações ou objetivos do mecanismo de apoio, possam vir a ser definidas na regulamentação própria de cada apoio.
Concluído o apuramento e a avaliação de danos, a CCDR comunica ao Ministério Público o respetivo resultado, para efeitos de eventual promoção de ações judiciais de natureza cível ou criminal.
Referências
Decreto-Lei n.º 98-A/2025 - DR n.º 161-A/2025, Série I de 24.08.2025
Decreto-Lei n.º 29/2018 - DR n.º 86/2018, Série I de 04.05.2018, artigo 20.º-A