O Tribunal da Relação de Évora (TRE) decidiu ser inadmissível a obtenção de dados de localização celular relativos a um número indeterminado de pessoas, não identificadas, que tenham estado no local no momento em que foram praticados os factos que deram origem ao inquérito crime.
O caso
O Ministério Público (MP) instaurou um inquérito crime após a realização, durante uma tarde, de um assalto a várias lojas levado a cabo, alegadamente, por três indivíduos encapuzados e armados com armas de fogo.
Para tentar identificar os autores dos roubos, o MP pediu ao juiz para que fossem obtidos junto dos operadores de serviços telefónicos móveis dados sobre os telemóveis que se encontravam no local no dia e na hora em que tivera lugar o assalto, bem como os dados de tráfego relativos a todas as comunicações registadas no local durante esse período.
O juiz indeferiu o pedido considerando-o inadmissível uma vez que a diligência não era dirigida a uma pessoa determinada mas sim a todos os presentes no local no momento do assalto, abrangendo pessoas inocentes e que nada tinham a ver com este.
Discordando dessa decisão, o MP interpôs recurso para o TRE.
Apreciação do Tribunal da Relação de Évora
O TRE julgou o recurso improcedente, confirmando a rejeição do pedido formulado pelo MP, ao considerar inadmissível a obtenção de dados de localização celular relativos a um número indeterminado de pessoas, não identificadas, que tenham estado no local no momento em que foram praticados os factos que deram origem ao inquérito crime.
Segundo o TRE, a falta de suspeito ou suspeitos determinados contra quem dirigir as escutas telefónicas, os pedidos de obtenção de dados de tráfego ou os pedidos de localização celular, constitui um obstáculo intransponível à realização deste tipo de meios de obtenção de prova.
A lei apenas admite a obtenção de dados de tráfego referentes a comunicações telefónicas e de dados de localização celular em relação a determinados crimes, quando a diligência seja indispensável para a descoberta da verdade ou a prova impossível ou muito difícil de obter por outra forma e quando seja dirigida contra o suspeito ou arguido, contra pessoa que sirva de intermediário ou contra a vítima, mediante o consentimento desta.
Devendo ainda a decisão judicial de transmitir os dados respeitar os princípios da adequação, necessidade e proporcionalidade, designadamente no que se refere à definição das categorias de dados a transmitir e das autoridades competentes com acesso aos dados e à proteção do segredo profissional.
Embora o suspeito não tenha de ser completamente identificado ou individualizado, bastando que seja pessoa concreta, determinável ou passível de individualização, tal não significa que possam ser pedidos dados de localização geográfica relativos a todas as pessoas que, sendo detentoras de telemóveis, estavam no local no momento em que foi cometido o roubo, sendo a grande maioria delas totalmente alheias aos factos em investigação
Nesse sentido, recolher informações de pessoas inocentes, na esperança de, entre estas, encontrar algum suspeito da prática do crime, é desproporcional aos fins visados, constituindo uma compressão inconstitucional e ilícita do direito à privacidade e à inviolabilidade das comunicações.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido no processo n.º 54/15.5GCBNV-A.E1, de 19 de maio de 2015
Código de Processo Penal, artigos 187.º e 189.º
Lei n.º 32/2008, de 17/07, artigos 2.º, 4.º e 9.º
Constituição da República Portuguesa, artigos 18.º, 26.º n.º 1 e 34.º n.º 1