O Tribunal da Relação de Évora (TRE) decidiu que é legítima a ordem dada pela polícia a um condutor para se submeter ao teste de pesquisa de álcool no sangue depois de ter acabado de estacionar o seu veículo automóvel à porta da sua residência, incorrendo o mesmo na prática do crime de desobediência quando se recuse a realizar esse teste.
O caso
Depois de ter estacionado o carro, um condutor foi abordado por um agente da PSP que, por suspeitar que ele estaria sob o efeito de álcool, lhe solicitou os documentos e ordenou que se submetesse ao exame de pesquisa de álcool no ar expirado para detetar a presença de álcool no sangue.
Mas o condutor recursou-se a efetuar o exame, apesar de advertido, por diversas vezes, de que incorreria na prática de um crime de desobediência.
Em consequência, o condutor acabou julgado e condenado no pagamento de uma multa pela prática desse crime, bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria por um período de cinco meses.
Inconformado, ele recorreu para o TRE.
Apreciação do Tribunal da Relação de Évora
O TRE negou provimento ao recurso, confirmando na íntegra a sentença recorrida, ao decidir que é legítima a ordem dada pela polícia a um condutor para se submeter ao teste de pesquisa de álcool no sangue depois de ter acabado de estacionar o seu veículo automóvel à porta da sua residência, incorrendo o mesmo na prática do crime de desobediência quando se recuse a realizar esse teste.
Diz a lei que os condutores que recusem submeter-se às provas estabelecidas para a deteção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas são punidos por crime de desobediência.
Tratando-se de um crime de direito penal clássico, cuja existência e respetivos elementos integradores se presumem conhecidos pela normalidade dos cidadãos, a consciência da ilicitude decorre da própria representação e vontade de praticar os factos que preenchem objetivamente o tipo penal, encontrando-se associada ao dolo. Assim, nesses casos, inexiste necessidade de autonomamente se provar em julgamento que o arguido estava consciente da ilicitude da sua conduta.
Sendo o sentido da previsão legal de condutor que releva para efeitos penais decorrente do facto de ter existido condução, uma vez que o que legitima a ordem de submissão ao teste de pesquisa de álcool no sangue é a circunstância de essa condução ter sido presenciada pelos agentes de autoridade no momento da abordagem ou em momento imediatamente anterior.
Outra interpretação, que passasse por associar o conceito de condutor ao exercício da condução no preciso momento da abordagem policial abriria caminho a incompreensíveis situações de impunidade, designadamente nos casos em que, sabendo que tinham sido vistos a conduzir pelos agentes de autoridade, os condutores, visando fugir à Justiça, encetassem uma fuga e viessem a ser intercetados após perseguição policial, quando já se encontrassem fora do veículo.
Assim, tendo existido condução efetiva, encontra-se legitimada a investigação da prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, revelando-se absolutamente irrelevante que, no momento em que lhe é dada a ordem para realizar o teste de alcoolemia, o condutor ainda esteja dentro do veículo e seja mandado parar ou que tenha parado por sua iniciativa e estacionado o veículo imediatamente a seguir à condução presenciada pelo agente de autoridade. Em ambas as situações a lei prevê que os condutores que recusem submeter-se às provas estabelecidas para a deteção do estado de influenciado pelo álcool são punidos pelo crime de desobediência.
Crime esse que se consuma com a recusa do arguido em realizar o teste de pesquisa de álcool no sangue após ter recebido ordem legítima para o efeito, não interferindo nessa consumação o facto de aquele, algum tempo depois, se dispor a fazer o teste que num primeiro momento se recusou a realizar.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido no processo n.º 242/22.8PFSTB.E1, de 28 de março de 2023
Código da Estrada, artigo 152.º n.º 1 alínea a)
Código Penal, artigo 348.º n.º 1 alínea a)