O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que não é suficiente para ilidir a presunção de culpa do banco, em caso de transferência fraudulenta realizada através dos serviços de internet banking, a alegação e prova dos procedimentos de segurança adotados, relativos à emissão do cartão respetivo e códigos de acesso, e das advertências e recomendações publicitadas e transmitidas ao utilizador.
O caso
Uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) viu, num mesmo dia, serem transferidos da sua conta de depósitos a prazo, através do sistema de banca electrónica, 10.000 euros e 9.500 euros sem que tivesse dado qualquer autorização para tal.
Logo que tomou conhecimento das transferências anómalas contactou o banco para que este bloqueasse o acesso informático à conta e requereu que fosse reposto o dinheiro movimentado indevidamente.
No entanto, apenas recebeu de volta 282 euros, relativos à primeira transferência, e os 9.500 euros da segunda, depois de os titulares da contas para as quais o dinheiro tinha sido transferido terem dado autorização para tal.
O banco rejeitou qualquer responsabilidade pelo sucedido, afirmando que o seu sistema era totalmente seguro e que fora a IPSS quem permitira o acesso de terceiros aos seus códigos pessoais, desrespeitando as regras de segurança que lhe tinham sido transmitidas.
Impossibilitada de pagar a funcionários e colaboradores, a IPSS recorreu a tribunal pedindo para que o banco fosse condenado a restituir-lhe o dinheiro em falta e a pagar-lhe uma indemnização por danos causados.
A ação foi julgada procedente, tendo o banco sido condenado a devolver os 9.718 euros em falta e a pagar uma indemnização à IPSS no valor de 2.500 euros, acrescida de juros contados desde a citação até integral pagamento.
Inconformado com essa decisão, o banco recorreu para o TRL.
Apreciação do TRL
O TRL apenas alterou a decisão quanto à contagem dos juros, tendo quanto ao mais confirmado a responsabilidade do banco pela devolução do dinheiro transferido indevidamente da conta da sua cliente, através da utilização fraudulenta do sistema de banca electrónica.
Em caso de transferência fraudulenta efetuada através dos serviços de internet banking, a lei consagra uma presunção de culpa da instituição bancária que esta terá de ilidir por forma a evitar a sua responsabilização e a devolução ao cliente do dinheiro que tenha sido indevidamente movimentado.
Segundo o TRL, para ilidir essa presunção não basta à instituição de crédito a alegação e prova dos procedimentos de segurança adotados, relativos à emissão do cartão e dos respetivos códigos de acesso e às advertências e recomendações publicitadas e transmitidas ao utilizador, sobretudo quando não tenha ficado demonstrada qualquer culpa deste nem qual o tipo de intromissão fraudulenta concretamente verificado.
É a própria lei que prevê que quando um utilizador de serviços de pagamento negue ter autorizado uma operação de pagamento executada, a utilização do instrumento de pagamento registada pelo prestador de serviços de pagamento, por si só, não é necessariamente suficiente para provar que a operação de pagamento foi autorizada pelo ordenante, que este último agiu de forma fraudulenta ou que não cumpriu, deliberadamente ou por negligência grave, uma ou mais das suas obrigações.
Além disso, em relação a uma operação de pagamento não autorizada, presume-se a culpa do prestador de serviços de pagamento do ordenante que não proceda ao imediato reembolso deste do montante da dita operação.
O TRL concluiu afirmando que, ao contrário do que acontece quanto à verba que o banco esteja obrigado a restituir ao cliente, cujos juros são contados desde a data da citação, a indemnização por danos não patrimoniais apenas vence juros de mora desde a data da sua liquidação, efetuada com a prolação da sentença.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 337/14.1YXLSB.L1-2, de 21 de maio de 2015
Código Civil, artigos 799.º n.º 1 e 805.º
Decreto-Lei n.º 317/2009, de 30/10, artigos 68.º, 70.º e 71.º do Anexo I
Decreto-Lei n.º 298/92, de 31/12, artigo 73.º