O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) aceitou a impugnação da venda de um imóvel, apresentada pela empresa devedora, por um preço inferior a metade do seu valor de mercado, com um prazo de pagamento de 10 anos e diferimento para o futuro quanto à fixação das condições de pagamento, que a deixe sem meios patrimoniais que permitam satisfazer a totalidade das suas obrigações, desde que se prove que os outorgantes do contrato tinham consciência do prejuízo que causavam aos credores.
O caso
Estando em dívida com o pagamento de 442.000,50 euros mais juros a uma empresa de construção civil, pela execução de um contrato de empreitada, uma empresa vendeu uma fração autónoma por menos de metade do seu valor de mercado, com um prazo de pagamento de 10 anos, em modalidade e forma de pagamento a acertar entre as partes.
Sendo que a empresa devedora, constituída por um pai e os seus quatro filhos, vendera o imóvel a uma empresa constituída por três desses filhos e por um sobrinho e a mulher deste, tendo o negócio deixado a empresa devedora sem património que lhe permitisse pagar as suas dívidas, uma vez que o que detinha estava fortemente onerado com hipotecas e penhoras.
Essa situação levou a que a empresa credora impugnasse judicialmente o negócio, pedindo para que lhe fosse reconhecido o direito de executar diretamente o imóvel para satisfação do seu crédito.
A ação foi julgada procedente, decisão com a qual as empresas demandadas não concordaram e da qual recorreram para o TRL.
Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa
O TRL negou provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida, ao decidir que estavam reunidos todos os requisitos legais para a procedência da impugnação.
Entendeu o TRL que, a venda de um imóvel, por um preço inferior a metade do seu valor de mercado, com um prazo de pagamento de 10 anos, ainda por cima com diferimento para o futuro quanto à fixação das condições de pagamento, não pode deixar de ser considerado como prejudicial para a vendedora.
Pelo que, estando o património desta fortemente onerado com hipotecas e penhoras, numa situação aparente de insuficiência de meios patrimoniais próprios para satisfazer a totalidade das suas obrigações, esse negócio, ao retirar da sua esfera jurídica um bem que poderia garantir o pagamento pelo menos de parte substancial da dívida, tem de ser considerado também prejudicial para os credores.
Se a isso acrescer o facto de ter sido dado como provado que os outorgantes do contrato de compra e venda tinham consciência do prejuízo que causavam aos credores, estão reunidos todos os requisitos legais para a procedência da impugnação.
Devendo, assim, ser reconhecido ao credor o direito de executar diretamente o imóvel vendido para satisfação do seu crédito.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 864/12.5TCFUN.L1-2, de 18 de fevereiro de 2016
Código Civil, artigos 610.º, 611.º, 612.º e 616.º