O Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) decidiu que, em sede de impugnação judicial, o titular do documento de identificação do veículo já não pode ilidir a presunção de que era ele quem o conduzia no momento da infração.
O caso
Um veículo foi detetado pelo radar a circular em excesso de velocidade, o que levou a que, na impossibilidade de identificar o condutor, fosse levantado auto de contraordenação contra o respetivo proprietário, enquanto titular do documento de identificação do veículo.
Notificado desse facto, para poder apresentar a sua defesa, e da possibilidade de nesse momento indicar que fora outra a pessoa que conduzira o veículo em excesso de velocidade, o proprietário nada disse, tendo-se limitado a proceder ao pagamento voluntário da coima.
Em consequência, foi condenado em sanção acessória de inibição de conduzir por um período de 45 dias, suspensa na sua execução sob condição de ele frequentar uma ação de formação no módulo velocidade.
Inconformado com essa decisão, o proprietário do veículo impugnou-a judicialmente alegando que não fora ele quem cometera a infração mas sim o seu sogro, a quem tinha emprestado o veículo e que conduzia o veículo quando o radar o detetara em excesso de velocidade.
Mas a impugnação foi julgada improcedente, decisão da qual o proprietário recorreu para o TRC.
Apreciação do Tribunal da Relação de Coimbra
O TRC negou provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida, ao decidir que, em sede de impugnação judicial, o titular do documento de identificação do veículo já não pode ilidir a presunção de que era ele quem conduzia o veículo no momento da infração.
Diz a lei que, quando se trate de contraordenação praticada no exercício da condução e o agente de autoridade não puder identificar o autor da infração, deve ser levantado o auto de contraordenação ao titular do documento de identificação do veículo, correndo contra ele o correspondente processo.
Trata-se de uma presunção de que foi ele quem cometeu a infração, a qual pode ser por ele ilidida no momento em que for notificado para apresentar a sua defesa, procedendo à identificação do verdadeiro condutor.
Se o fizer, o processo contra si é suspenso e é instaurado um novo processo contra a pessoa por ele identificada como infratora. Se nada disser, então já não o poderá fazer na fase de impugnação judicial da decisão administrativa de aplicação de coima e sanção acessória.
Trata-se de uma presunção que só pode ser ilidida se for provada a utilização abusiva do veículo ou identificado um terceiro, dentro do prazo legal concedido para a defesa. Ultrapassado esse prazo, já não é possível afastar a presunção, uma vez que seria de todo contrário ao espírito e letra da lei que tal pudesse acontecer depois de aplicada a sanção pela autoridade competente.
E compreende-se que assim seja, uma vez que está assegurado o direito de defesa do arguido e as sanções contraordenacionais não constituem penas, mas medidas sancionatórias de caráter não penal, não repugnando que possam recair sobre quem não cometeu o facto ilícito típico, mas sobre quem, em determinadas circunstâncias, o podia e devia ter evitado.
Assim, não tendo sido alegada nem demonstrada a utilização abusiva do veículo, e face à presunção de que foi o proprietário do mesmo quem cometeu a infração, a qual não pode ser ilidida durante a fase judicial, deve ser rejeitada a impugnação, sendo de todo irrelevantes as declarações do arguido e das testemunhas por ele arroladas, quando relataram que não era ele quem conduzia o veículo no momento da infração.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo n.º 86/15.3T8VIS.C1, de 24 de fevereiro de 2016
Código da Estrada, artigo 171.º n.º 2 e 3