O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que, em sede de incidente de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais, o tribunal não pode afirmar a extensão da obrigação de prestação de alimentos por parte do pai, além da maioridade do filho, e, simultaneamente, recusar a possibilidade de ele provar a existência de alguma das circunstâncias que, nos termos da lei, o dispensariam dessa obrigação.
O caso
Perante a falta de pagamento da pensão de alimentos devida ao seu filho, uma mãe recorreu a tribunal, intentando um incidente de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais.
Entretanto, no dia 07/07/2015, o filho atingiu a maioridade e, face à entrada em vigor, no dia 01/10/2015, da lei que estabeleceu que a obrigação de alimentos fixada para filhos menores se mantém até aos 25 anos, o tribunal, além de declarar o incumprimento, decidiu que a pensão de alimentos continuava a ser devida além da maioridade, mediante a mera junção de documentos que demonstrassem que o filho ainda estava a estudar.
Discordando desta decisão, o pai recorreu para o TRL defendendo que a lei nova não era aplicável à sua situação, uma vez que entrara em vigor depois do filho ter atingido a maioridade e de se ter iniciado o incidente de incumprimentos. Defendeu, ainda, que o tribunal devia ter conhecido da falta de razoabilidade de ter de continuar a pagar a pensão de alimentos, ainda por cima no mesmo montante que pagava durante a menoridade.
Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa
O TRL concedeu provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida na parte em que declara que o valor da prestação de alimentos era devido além da maioridade, por considerar que, previamente, tinha de ser apreciada a questão suscitada pelo progenitor sobre a inexigibilidade dessa prestação.
Decidiu o TRL que a alteração introduzida na lei, a partir de outubro de 2015, que estabeleceu que a obrigação de alimentos fixada para filhos menores se mantém até aos 25 anos, é aplicável a todos os casos pendentes à data da sua entrada em vigor, quando os jovens ainda se encontrem a completar a sua educação ou formação profissional e existam alimentos fixados na menoridade.
E que essa alteração veio inverter o ónus da prova, ou seja, deixou de ser o filho maior a ter o ónus de requerer a atribuição de prestação de alimentos para passar a ser o progenitor a ter de intentar uma ação para pôr fim a essa prestação, caso haja fundamento para tal.
Porém, não pode o tribunal afirmar a extensão dessa obrigação por parte do pai, para além da maioridade, depois de ter notificado a mãe para comprovar que o filho ainda estava a estudar, e, simultaneamente, recusar a possibilidade de o pai provar a existência de alguma das circunstâncias que, nos termos da lei, o dispensariam dessa obrigação.
Se a declaração de continuidade da prestação de alimentos decorre da normal tramitação do incidente de incumprimento, na qual se insere, até porque nele sempre se determina também o pagamento das prestações vincendas, então não pode deixar de se conhecer de alguma das circunstâncias especificadas na lei que ponham em causa a exigibilidade dessas prestações vincendas.
Segundo o TRL, não pode decidir-se que o pai está obrigado a pagar determinada prestação, ignorando as razões apresentadas pelo mesmo, que a provarem-se, poderiam tornar inexigível essa obrigação, e obrigá-lo a intentar uma ação autónoma com o objetivo de provar essas razões.
Assim, tendo ele alegado factos suscetíveis de integrar a irrazoabilidade da exigência da prestação de alimentos, deverá tal questão ser apreciada, pois pode prejudicar a decisão recorrida na parte em que declara que a prestação de alimentos é devida para além da maioridade.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 5637-11.0TBCSC-A.L1-2, de 30 de junho de 2016
Lei n.º 122/2015, de 01/09
Código Civil, artigo 1905.º n.º 2