O Tribunal da Relação de Guimarães (TRG) decidiu que não acarreta prejuízo sério para o trabalhador, passível de justificar a resolução do contrato de trabalho com direito a compensação, a transferência definitiva do seu local de trabalho para outro situado a cerca de cinco quilómetros do anterior, com transportes públicos à sua disposição, passando aquele a despender entre 15 a 20 minutos em deslocações diárias quando antes ia a pé para o trabalho e podia prestar apoio familiar à filha menor no horário pós-escolar e à mãe já idosa.
O caso
Em 2004, um médico foi convidado para fazer parte de uma clínica, o que implicava encerrar o seu consultório privado onde até então vinha exercendo a sua atividade profissional. Em consequência, falou com a assistente que com ele trabalhava desde 1996 ponderando a possibilidade de proceder à extinção do seu posto de trabalho ou de lhe conseguir colocação como funcionária da clínica, marcando uma entrevista com a pessoa responsável pelo recrutamento.
Realizada a entrevista, a trabalhadora recusou a proposta que lhe foi apresentada pela clínica, designadamente devido à distância que teria de percorrer diariamente, de cerca de cinco quilómetros.
Perante essa decisão, o médico comunicou-lhe a alteração definitiva do seu local de trabalho para a clínica, mantendo o contrato em vigor e todas as condições do mesmo. Ao que a trabalhadora respondeu não poder aceitar essa mudança, uma vez que deixaria de poder deslocar-se a pé para o seu local de trabalho e de poder prestar apoio à filha e à mãe.
Tendo, depois, intentado uma ação contra o médico na qual pediu para que fosse reconhecido que o contrato cessara por extinção do posto de trabalho e que o despedimento fora ilícito ou, em alternativa, que fosse reconhecido que ela procedera à resolução do contrato de trabalho com justa causa, tendo direito à respetiva compensação.
Mas o tribunal entendeu que o médico não pusera fim ao contrato e que a transferência do local de trabalho não constituía motivo capaz de justificar a resolução do mesmo, com justa causa, pela trabalhadora, decisão com a qual esta não se conformou e da qual recorreu para o TRG.
Apreciação do Tribunal da Relação de Guimarães
O TRG negou provimento ao recurso ao decidir que não acarreta prejuízo sério para o trabalhador, passível de justificar a resolução do contrato de trabalho com direito a compensação, a transferência definitiva do seu local de trabalho para outro situado a cerca de cinco quilómetros do anterior, com transportes públicos à sua disposição, passando aquele a despender entre 15 a 20 minutos em deslocações diárias quando antes ia a pé para o trabalho e podia prestar apoio familiar à filha menor no horário pós-escolar e à mãe já idosa.
Entendeu o STJ que não pode considerar-se que houve despedimento duma trabalhadora quando tal apenas tenha sido ponderado como hipótese pelo empregador, em simultâneo com a contratação daquela por parte da entidade em que o mesmo ia passar a laborar como médico, e, não tendo a trabalhadora aceitado tal solução, o empregador tenha optad pela transferência do local de trabalho, sem perda de garantias, após o que a trabalhadora procedeu à resolução do contrato de trabalho com invocação de justa causa, alegando prejuízo sério decorrente dessa transferência.
É verdade que, segundo a lei, a transferência definitiva de local de trabalho, nomeadamente devido à mudança ou extinção, total ou parcial, do estabelecimento onde o trabalhador preste serviço, confere a este a possibilidade de resolver o contrato de trabalho, com direito a compensação, mas apenas se essa mudança lhe acarretar um prejuízo sério.
Prejuízo esse que não tem que ser necessariamente patrimonial e que deve ser aferido tendo em conta as condições de vida do trabalhador e fatores como a escolha da sua residência, a distância para o novo local de trabalho, o custo de vida, a duração e o horário dos transportes e a vida familiar do trabalhador.
Assim, segundo o STJ, o mero facto da mudança de local de trabalho, para outro situado a uma curta distância, ter impedido a trabalhadora de se deslocar a pé para o trabalho, obrigando-a a socorrer-se dos transportes públicos disponíveis e a tardar cerca de 15 a 20 minutos por dia em deslocações, não é suficiente para que se considere essa transferência prejudicial.
O mesmo acontece com o facto da mudança impedir a trabalhadora de prestar o apoio familiar que até então prestava à sua família, nomeadamente à filha menor no horário pós-escolar, que se deslocava para o consultório em que antes prestava serviço, e à mãe, já idosa, uma vez que se tratam de dificuldades inerentes à prestação de trabalho por qualquer trabalhador, só sendo atendíveis as situações acauteladas legalmente ou os prejuízos que excedam as expectativas razoáveis decorrentes das condições fixadas no contrato.
Concluiu o STJ que se tratava de uma mudança relativamente à qual não se vislumbrava qualquer perturbação assinalável na organização diária da trabalhadora, sendo irrelevantes os transtornos que a mesma alegara e lograra provar. Pelo que não lhe assistia o direito de resolver o contrato de trabalho mediante compensação.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no processo n.º 443/14.2TTVCT.G1, de 19 de maio de 2016
Código do Trabalho, artigos 129.º, 193.º, 194.º, 196.º 340.º, 351.º e 357.º
Código Civil, artigos 217.º, 224.º, 236.º e 342.º