O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que, em nome do superior interesse dos menores, é de afastar o convívio entre avó e netos quando o mesmo, devido ao comportamento daquela e ao conflito que a mesma mantém com os pais dos seus netos, deixe de ser gratificante em termos afetivos e de formação da personalidade das crianças.
O caso
Uma avó recorreu a tribunal pedindo para que lhe fosse reconhecido o direito de estar com os netos maternos e fixado o respetivo regime de convívio, sem necessidade da presença dos pais. Fê-lo alegando que sempre fora próxima dos netos, até ao dia em que, sem motivo que o justificasse, os pais passaram o evitar os convívios, impedindo-a de aceder aos netos e de conviver regularmente com eles e impondo, como condição para os contactos, que os mesmos fosse tidos apenas sob a sua vigilância.
Citados, os pais alegaram que a avó era desequilibrada, obsessiva e sufocante para com as crianças, contribuindo para a instabilidade emocional das mesmas.
O tribunal julgou a ação procedente e fixou um regime de convívio entre a avó e os netos, abrangendo fins-de-semana, férias de Natal e da Páscoa e férias de Verão. Mais decretou uma sanção pecuniária compulsória de 100 euros por cada dia, após a notificação da sentença, que os pais deixassem de facultar à avó a companhia dos netos. Inconformados, os pais dos menores recorreram para o TRL.
Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa
O TRL julgou procedente o recurso, revogando a sentença recorrida, ao decidir que, em nome do superior interesse dos menores, é de afastar o convívio entre avó e netos quando o mesmo, devido ao comportamento daquela e ao conflito que a mesma mantém com os pais dos seus netos, deixe de ser gratificante em termos afetivos e de formação da personalidade das crianças.
A lei estabelece um direito de convívio entre avós e netos em nome das relações afetivas existentes entre certos membros da família e do auxílio entre gerações, ao estabelecer que os pais não podem injustificadamente privar os filhos do convívio com os ascendentes.
Direito que é justificado pelo facto do convívio entre avós e netos permitir uma integração numa família mais alargada, promover a formação e transmissão da memória familiar e do sentido de pertença, fortalecer laços recíprocos de afetividade, correspondendo, presumidamente, a um benefício em termos de desenvolvimento e formação da personalidade das crianças, direito que se encontra consagrado constitucionalmente.
Não obstante, tem o mesmo de ser sempre ponderado em função do critério prevalecente do superior interesse da criança. Este condiciona o direito de visita dos avós, podendo conduzir à sua limitação ou mesmo supressão, quando seja suscetível de lhe acarretar prejuízos ou de o afetar negativamente.
Assim, se existirem obstáculos, seja qual for a sua origem, a que o estabelecimento de uma relação afetiva entre as crianças e a avó ocorra de forma tranquila e psicologicamente recompensadora para estes últimos, os desideratos acima referidos não são alcançados, e, ainda que a avó persista na vontade de ver consagrado o direito a conviver com os netos, tal pretensão está votada ao insucesso por não ser esse o interesse prevalecente, ou seja, o das crianças
Estando provado que a avó e os pais dos seus netos se deixaram de falar e que as tentativas de aproximação daquela aos netos, à revelia dos pais, foram muito mal sucedidas e causaram embaraço aos jovens, destabilizando-nos emocionalmente com as suas visitas à escola e tentativas de comprar a sua amizade e proximidade, a ponto de os levar a repudiar esses contactos e a rejeitarem a possibilidade de conviverem com a avó, não é do superior interesse deles manterem esse convívio, uma vez que a relação que deveria ser gratificante em termos afetivos e de formação da sua personalidade, não o é.
Mais, enquanto a relação entre os adultos continuar a ser de permanente conflito, dificilmente haverá pacificação e melhoria na relação entre avó e netos, não devendo as crianças ser sistematicamente expostas e sujeitas a esse conflito.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 3382/11.5TBVFX-A.L1-1, de 10 de abril de 2018
Código Civil, artigo 1887.º-A
Constituição da República Portuguesa, artigos 26.º n.º 1, 68.º n.º 1 e 69.º n.º 1