O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que, ainda que a criança seja estimulada pela mãe a não querer estar com o pai, não deve a mesma ser entregue de forma abrupta ao pai, depois de sempre ter vivido com a mãe, mas sim serem criadas condições para amplas oportunidades de contacto do menino com o pai e a sua família.
O caso
Após o divórcio dos seus pais, uma criança ficou a viver com a mãe, a quem foi atribuída a sua guarda, tendo sido estipulado um regime de visitas e organização de tempos para convívio do menor com o pai.
Durante essas visitas a criança manifestou-se contra estar com o pai, estando os técnicos sociais convictos de que tal acontecia devido à oposição da mãe e porque o menor tinha receio de que ela e o avô materno considerassem que ele queria estar com o pai. Só depois de muita insistência é que ele acabou por aceitar estar e conviver com o pai, embora em sofrimento psicológico, com receio de desagradar à mãe e ao avô.
Em consequência, o pai requereu a alteração do das responsabilidades parentais relativas ao seu filho, tendo o tribunal decidido fixar um novo regime provisório, fixando a residência da criança com o pai, tendo em conta o facto de a mãe, com a sua conduta, impedir o filho de manifestar livremente os seus desejos e vontade em estar com o pai, estando a por em causa o seu equilíbrio psíquico. Inconformada com esta decisão, a mãe recorreu para o TRP.
Apreciação do Tribunal da Relação do Porto
O TRP julgou procedente o recurso, revogando o regime provisório de regulação do exercício de responsabilidades parentais relativas ao menor e fixando a residência deste com a mãe, a quem caberá o exercício das responsabilidades parentais nas questões de particular importância.
Decidiu o TRP que, ainda que a criança seja estimulada pela mãe e não querer estar com o pai, não deve a mesma ser entregue de forma abrupta ao pai, depois de sempre ter vivido com a mãe, mas sim serem criadas condições para amplas oportunidades de contacto do menino com o pai e a sua família.
Na Síndrome de Alienação Parental o progenitor alienador procura isolar a criança, reduzir a sua comunicação com o meio envolvente e supervisionar o seu contacto com o outro progenitor. Trata-se de um fenómeno passível de afetar negativamente o desenvolvimento da saúde psicológica e até física do menor.
Não obstante, a aliança entre a criança e um dos progenitores na recusa do convívio com o outro pode não corresponder à Síndrome de Alienação Parental, mas advir apenas de um intenso conflito entre os pais e de dinâmicas familiares disfuncionais em que a criança é estimulada a tomar partido em relação a um dos progenitores contra o outro.
Nessas circunstâncias, um corte abrupto de uma criança de cerca de nove anos com a sua mãe, colocando-a a residir com o pai, num ambiente familiar desconhecido, na nova família do seu pai, numa cidade diferente, com um relacionamento interpessoal inteiramente novo, não serve o seu crescimento harmonioso e a salutar relação de filiação com os dois progenitores.
Segundo o TRP, as relações de afetividade não se criam pela força e, embora o são crescimento do menor aconselhe uma maior proximidade com o pai, através de um convívio frequente e regular, o mesmo deve ser estabelecido de forma gradual e com cuidado, sem que lhe possa ser imposto contra a sua vontade, ainda que esta possa estar manipulada na sua génese.
Nesse sentido, concluiu o TRP, que a solução adotada pelo regime provisório fixado não era consentânea com o interesse do menor, estando longe de favorecer a sua estabilidade emocional e podendo gerar ansiedade, medo, insegurança e angústia passíveis de perturbar o seu equilíbrio, decidindo-se pela sua revogação e pelo regresso do menor à guarda da mãe, estabelecendo condições para amplas oportunidades de contacto do menino com o pai e a sua família.
Referências
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 23186/15.5T8PRT-B.P1, de 7 de dezembro de 2018
Código Civil, artigo 1906.º n.º 7