A Comissão Europeia (CE) adotou determinadas normas internacionais de contabilidade, na sequência da atualização, pelo Conselho das Normas Internacionais de Contabilidade (IASB), de várias normas, interpretações e emendas.
Na lista das Normas consta a IFRS 17, o normativo contabilístico que trata do reconhecimento, mensuração, apresentação e divulgação das responsabilidades com contratos de seguros, que entra em vigor este mês.
O novo Regulamento da CE entra em vigor a 16 de outubro.
A IFRS 17 é aplicável aos contratos de seguro, aos contratos de resseguro e aos contratos de investimento com características de participação discricionária.
Para facilitar a admissão à cotação em países terceiros ou para satisfazer as expectativas dos investidores mundiais, as empresas da UE podem aplicar a IFRS 17 tal como foi publicada pelo IASB, com algumas ressalvas que a Comissão deverá reexaminar até 31 de dezembro de 2027. Trata-se da isenção do requisito de utilização das coortes anuais para os contratos mutualizados numa base intergeracional e com compensação dos fluxos de caixa, cuja análise pela CE terá em conta a análise realizada pelo IASB do período subsequente à aplicação da IFRS 17.
Aceda aqui à IFRIS 17.
A IFRIS 17
No âmbito de um Regulamento da CE de 2002, em cada exercício financeiro com início em ou depois de 1 de janeiro de 2005, as sociedades regidas pela legislação de um Estado-Membro cujos títulos são negociados publicamente devem, em determinadas condições, elaborar as suas contas consolidadas em conformidade com as normas internacionais de contabilidade definidas por regulamento da Comissão. Outro Regulamento CE, de 2008, adotou normas internacionais de contabilidade e interpretações conexas emitidas ou adotadas pelo IASB até 15 de outubro de 2008. O regulamento tem vindo a ser alterado a fim de incluir as novidades do IASB adotadas pela Comissão até 8 de setembro de 2022.
Em 18 de maio de 2017, o IASB publicou a Norma Internacional de Relato Financeiro (IFRS) 17 Contratos de Seguro (IFRS 17) e, em 25 de junho de 2020, as emendas a essa IFRS 17.
Com todas estas alterações, a CE revogou agora o seu regulamento de 2008, que é substituído pelo novo.
Segundo a Comissão Europeia, a IFRS 17 proporciona uma abordagem global para a contabilização dos contratos de seguro. Tem como objetivo garantir que as empresas forneçam, nas suas demonstrações financeiras, informações pertinentes que representem fielmente os contratos de seguros. Essas informações fornecem aos utilizadores das demonstrações financeiras uma base sólida para avaliarem o efeito dos contratos de seguro na posição financeira, no desempenho financeiro e nos fluxos de caixa da empresa.
No âmbito do plano de implementação definido para a IFRS 17, a nível nacional, entre setembro e novembro de 2022 foi realizado o estudo de impacto quantitativo IFRS 17, dirigido a todas as empresas de seguros com sede em Portugal.
Consulte a propósito o relatório do estudo de impacto na IFRS 17, divulgado pela ASF, nos termos do qual, a aplicação das regras da IFRS 17 (e da IFRS 9 - Instrumentos financeiros na demonstração da posição financeira das empresas de seguro) pelas empresas de seguros nacionais determinou que os seus capitais próprios das empresas de seguros tenham recuado 247 milhões de euros, o que equivale a uma quebra de 4,1%, por comparação com as contas estatutárias.
Aplicação da IFRS 17
A IFRS 17 é aplicável aos contratos de seguro, aos contratos de resseguro e aos contratos de investimento com características de participação discricionária.
Existem na UE inúmeros contratos de seguros de vida e de seguro de vida-poupança distintos, os quais representam, segundo as melhores estimativas, um passivo total de aproximadamente 5,9 biliões de EUR (excluindo os contratos ligados a fundos de investimento). Em vários Estados-Membros, alguns desses contratos incluem características de participação direta e discricionária, que permitem repartir os riscos e os fluxos de caixa entre as diferentes gerações de tomadores de seguros.
Refere a CE que em certos Estados-Membros, os contratos de seguro de vida são também geridos de forma intergeracional, a fim de atenuar a exposição aos riscos de taxa de juro e de longevidade, e contam com um conjunto específico de ativos que respaldam o passivo por seguros, mas não assumem características de participação direta na aceção da IFRS 17.
Mediante autorização prévia das autoridades de supervisão dos seguros, é possível aplicar a alguns desses contratos o ajustamento de congruência para efeitos do cálculo do seu rácio Solvência II.
Assim, nos termos da IFRIS 17, uma entidade não deve incluir num mesmo grupo contratos emitidos com mais de um ano de intervalo. A CE prevê que as empresas podem optar por não aplicar este requisito (n.º 22 da IFRIS 17) a:
- Grupos de contratos de seguro com características de participação direta e grupos de contratos de investimento com características de participação discricionária, na aceção do apêndice A da IFRS 17 constante do anexo do presente regulamento, e cujos fluxos de caixa afetam ou são afetados pelos fluxos de caixa pagos aos tomadores de seguros de outros contratos (conforme apêndice B, parágrafos B67 e B68, da IFRS 17);
- Grupos de contratos de seguro que são geridos em função das diferentes gerações de contratos e que preenchem as condições estabelecidas na Diretiva Solvência II para ajustamento compensatório da estrutura pertinente das taxas de juro sem risco para os diferentes prazos, e tenham sido aprovados pelas autoridades de supervisão para efeitos da aplicação do ajustamento de congruência.
Desvios permitidos
Apesar de as empresas da UE poderem aplicar a IFRS 17 publicada pelo IASB em relação a mercados internacionais, os eventuais desvios a normas internacionais são circunscritos.
O requisito de utilização das coortes anuais como unidade de conta para grupos de contratos de seguros e contratos de investimento nem sempre reflete o modelo de negócios, nem as características jurídicas e contratuais dos contratos mutualizados numa base intergeracional e com compensação dos fluxos de caixa, referidos nos quinto e sexto considerandos. Esses contratos representam mais de 70% do total dos passivos por seguros de vida na União. A relação custo-eficácia resultante da aplicação a esses contratos do requisito de utilização das coortes anuais nem sempre é favorável.
Assim, atendendo ao contexto dos mercados financeiros à escala mundial em que se inserem as IFRS, apenas são contemplados desvios a estas normas internacionais em circunstâncias excecionais e de forma limitada.
Não obstante a definição de grupo de contratos de seguro (apêndice A da IFRS 17) as empresas da UE devem dispor da possibilidade de isentar os contratos mutualizados numa base intergeracional e com compensação dos fluxos de caixa do requisito de utilização das coortes anuais imposto pela IFRS 17.
Para que os investidores saibam se uma empresa aplicou a isenção desse requisito a determinados grupos de contratos, as empresas devem assinalar nas notas das suas demonstrações financeiras que o recurso à isenção faz parte dos seus principais métodos contabilísticos e fornecer outras informações explicativas como, por exemplo, a que carteiras aplicaram a referida isenção. Tal não deve implicar uma avaliação quantitativa da incidência do recurso a essa isenção facultativa do requisito de utilização das coortes anuais.
Referências
Regulamento (UE) 2023/1803 da Comissão, JO L 237 de 26.9.2023
Retificação do Regulamento (UE) 2023/1803 da Comissão, JO L 239 de 28.9.2023
Relatório do estudo de impacto da IFRIS 17 para contratos de seguros, ASF, 02.06.2023
Regulamento (CE) n.º 1606/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, JO L 243 de 11.9.2002
Diretiva 2009/138/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25.11.2009, artigo 77.º-B